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Rafael Mora confessou que houve pressão política para comprar o Diário Económico

Era do interesse do Grupo BES que o Diário Económico ficasse na órbita da Ongoing, disse Rafael Mora sobre a tal “pressão política”. Mora teve um papel muito interventivo na compra do Diário e Semanário Económico em 2008. A Ongoing pagou 27,5 milhões com o BES a financiar 24 milhões.
  • Rafael Luís Mora, sócio de Nuno Vasconcelos (ausente na foto), durante a sua audição perante a Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, na Assembleia da República, em Lisboa, 09 de junho de 2021. ANTÓNIO COTRIM/LUSA
9 Junho 2021, 20h51

O ex-sócio do patrão da Ongoing Nuno Vasconcellos, Rafael Mora, disse hoje no parlamento que “houve pressão política” para comprar o Diário Económico.

Foi Hugo Carneiro, deputado do PSD, quem chamou ao inquérito a aquisição em 2008 do Diário Económico e Semanário Económico por 27,5 milhões de euros, e em que o BES financiou 24 milhões de euros.

Rafael Mora esteve na parte operacional da concretização deste negócio e admitiu que participou nas negociações. Admitiu que o processo de venda inicialmente estava “viciado”.

Hugo Carneiro perguntou a Rafael Mora na Comissão Parlamentar de Inquérito do Novo Banco, porque é que a Ongoing pagou, em 2008, um múltiplo que era 20 vezes mais do que o valor do Diário Económico e Semanário Económico valiam.  “Era um instrumento da Ongoing, de Nuno Vasconcelos ou dos seus ‘amigos de infância’ para cumprir os objetivos, fossem eles quais fossem?”, perguntou o deputado.

“Foi um negócio curioso porque era um negócio que estava um bocadinho martelado cá em Portugal. Estava um bocado viciado. Havia pressão política”, disse no parlamento Rafael Mora.

O número dois da Ongoing foi hoje ouvido na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução.

“Havia pressão política para que fosse comprado pelo grupo Lena”, disse Mora que justifica com isso a subida do preço e do múltiplo da transação.

“A sensação que me deu no momento em que terminámos – não é porque ninguém mo disse abertamente – é que aquela venda do Diário Económico estava feita para que quem comprasse fosse o grupo Lena. Nós fomos uns ‘outsiders’ que entraram na negociação”, revelou.

Nuno Vasconcellos queria muito comprar o Diário Económico, disse ainda Rafael Mora.

Em 2008, o Diário Económico e o Semanário Económico foram comprados pela Ongoing ao grupo italiano Recoletos, do grupo italiano RCS, por um total de 27,5 milhões de euros, sendo que 24 milhões dos quais foram emprestados pelo Banco Espírito Santo – fazendo parte da dívida de 520 milhões que ficou por pagar ao atual Novo Banco.

O Diário Económico entrou em insolvência em 2016.

Houve três compradores na corrida – para além da Ongoing e do grupo Lena, e segundo as notícias da época também a Cofina esteve interessada bem como a Sonaecom que também participou numa fase inicial. Recorde-se que a Sonae tinha tentado comprar em OPA a Portugal Telecom um par de anos antes.

“Eu por acaso, e por razões de nacionalidade, conhecia o administrador delegado desse grupo”, disse Rafael Mora que admitiu que teve um papel ativo na compra dos jornais. “Tomei a liberdade de apanhar um avião e ir a Madrid falar com esse administrador delegado, e perguntei ‘se o negócio já estava feito com o grupo Lena”. Se sim “dizes-me e não fazemos figura de palhaço. Mas se queres que seja um processo de um leilão aberto, então marca uma data e uma hora para a entrega das propostas e abre-as em Madrid’ e ele disse-me que queria sacar o maior valor possível e que ia pedir ao banco que estava a intermediar esta operação para que receba as propostas fechadas e me traga a Madrid para escolher a melhor'”, relatou Mora que se recorda de a Ongoing ter o assessoria do BES Investimento nesta operação. O banco de investimento do BES preparava-se para oferecer, em nome da Ongoing, 27 milhões de euros pela empresa que tinha o Semanário e Diário Económico e foi Rafael Mora que sugeriu oferecer 27,5 milhões, para garantir que ganhava o concurso.

Havia três propostas, reconheceu. Segundo as notícias da época era o grupo Lena, Ongoing e Sonaecom.

Rafael Mora foi um grande defensor da compra da ST & SF que tinha o Diário e Semanário Económico.

“A marca era fantástica, e num processo TMT (Tecnologia, Media e Telecomunicações) fazia sentido e era rentabilizável a médio prazo. Se o Económico TV tivesse tido mais apoio dos canais de cabo hoje em dia podia ser um CMTV”, defendeu o responsável pela estratégia de media do grupo.

Rafael Mora acrescentou ainda que acreditava que havia “interesse do grupo BES em que o Diário Económico estivesse na órbita da Ongoing”, o que adicionado ao interesse do grupo Lena “fez subir o preço e o múltiplo”.

O EBITDA do grupo Económico era de um milhões de euros, o que compara com um preço pago de 27,5 milhões.

Recorde-se que o grupo Lena tinha ligações ao ex-primeiro ministro José Sócrates. Rafael Mora disse a também que ainda se pensou numa proposta conjunta Ongoing/Lena (houve um telefonema entre ambos) mas quer o grupo Lena, quer a Ongoing queriam 100% da empresa de media especializada.

“Nuno Vasconcellos queria muito comprar o Diário Económico e a 100%” (tal como o grupo Lena), para potenciar sinergias com o grupo Impresa, porque a sua ideia era controlar a Impresa e integrar nesse grupo o Diário Económico. “Fazia sentido do ponto de vista racional”, defendeu Mora.

A Ongoing vendeu 23,13% da Impresa por 50 milhões de euros em 2014.

Questionado por Hugo Carneiro se a Ongoing funcionava como ‘testa de ferro’ do grupo Espírito Santo, Rafael Mora disse que “não, não era. A Ongoing não era uma ‘testa de ferro’, era um amigo íntimo [de Ricardo Salgado], e que às vezes se revelava com alguma independência”, respondeu lembrando que a decisão de Nuno Vasconcellos comprar, uma semana depois da OPA da Sonae sobre a PT (que fracassou), 3,5% da PT financiado pelo BCP não foi do agrado de Ricardo Salgado.

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