Na Louisiana uma inundação “de proporções bíblicas” destruiu a casa de Tony Perkins, líder do Family Research Council, que diz que Deus provoca desastres naturais para punir os homossexuais. Não que isto seja novo: há dois anos Perkins disse que o furacão Joaquim foi o castigo de Deus pela legalização do casamento de pessoas do mesmo sexo. A novidade foi o feitiço virar-se contra o feiticeiro – ou Perkins é homossexual ou Deus castigou-o.

Perkins não é único. Em 2005 já o furacão Katrina foi classificado por grupos religiosos americanos como um castigo de Deus pelo “moral decay”. E rogar pragas não é específico de uma religião: em 2012 clérigos muçulmanos atribuíram o furacão Sandy a um castigo divino por um filme que troçava do Profeta Maomé. É isto verdade, ou apenas uma monumental coincidência? Bem, se a fé move montanhas, porque não há de fazer um furacãozito?

Vem isto a propósito da “political sorcery”, uma velha arte praticada em palácios e castelos e que ditava a sorte dos povos. Clausewitz disse que “a guerra é a continuação da política por outros meios”; poucos sabem que também disse que “a feitiçaria é a continuação da guerra por outros meios”. Quem domina esta arte pode permitir-se tudo, pois resolve por mágica o que os outros não conseguem. Trump chegou a presidente com a ajuda dos russos, mas o que a NSA não nos diz é que não foi dos internautas, mas de bruxos, a “Academia de Feiticeiros” de Putin, que ele mantém sob seu controlo por ser Voldemort. Lembremo-nos que já Reagan se despedia do embaixador soviético com um “os meus cumprimentos a Darth Vader”. Correu bem, o que nem sempre é o caso: uma francesa que conseguiu uma grande vitória há 600 anos acabou na fogueira, donde vem o termo político “estar queimado”. Outro exemplo é a prática política de fazer “rolar cabeças”, por a separação de cabeça e corpo ser uma forma de acabar com um feiticeiro. Na Pérsia deu lugar aos “ai-a-tola”.

Como não podia deixar de ser, há hoje serviços especializados de feitiçaria para políticos inexperientes, uma espécie de consultoria avançada. Em Hong Kong há feiticeiras que por 6,5 dólares lançam um feitiço (o ‘da siu yan’, ou “villain hitting”), e até se podem comprar kits “faça você mesmo”. Mas no momento de lançar um feitiço, ele tem que ser potente, para não se virar contra o feiticeiro. Qual é o feitiço mais potente do mundo? É português, o Feitiço da Geringonça, que apanha todos em si, até aqueles que o lançam e que dele não se conseguem mais libertar.

 

Nota biográfica: Hemp Lastru (n. 1954, em Praga) é sobrinho neto de Franz Kafka. Democrata convicto, activista e lutador político, é preso várias vezes pela polícia secreta checoslovaca, tendo sido sentenciado em 1985 ao corte de uma orelha sob a acusação de “escutar às portas”. Abandona a política em 1999, deixando Praga para residir em Espanha. Mudou-se para Portugal em 2005 porque “gostaria de viver num país onde os processos são como descrevia o meu tio-avô nos livros.”