Em grato momento de reflexão sobre os desafios da banca diante dos ziguezagues da economia, no qual tivemos a oportunidade de participar, Teixeira dos Santos sublinhou que a banca “é que tem de seguir a economia e não o inverso”.

Mas parece que os elevados níveis de incumprimento de reembolso dos empréstimos bancários, o denominado crédito malparado (ou NPL, non-performing loans, na sigla em inglês) só deram que pensar aos agentes económicos e não ao legislador.

A legislação europeia tem vindo a dar resposta ao desafio do equilíbrio difícil entre direitos dos devedores e dos credores. A legislação portuguesa tarda em dar sinais positivos à economia: os elevados níveis de NPL da banca poderão ser um tema também difícil, mas não dar resposta aos problemas reais não pode ser a solução.

A este respeito, alguns líderes europeus lançaram para a discussão a hipótese de uniformizar os tectos máximos de NPL para todos os bancos da União Europeia (EU) por decreto, propondo a sua redução, por imposição das instituições europeias, para 5% num curto período de tempo.

Será possível? E desejável? Em tese, dir-se-ia sim à primeira pergunta e não à segunda.

No caso dos bancos portugueses, quando os números do crédito malparado se situam por volta dos 13% e a tendência decrescente tem vindo a registar-se de forma consistente, um corte tão drástico pode não ser razoável.

Do ponto de vista do negócio bancário, tal imposição significaria vender estes créditos não performativos por preço vil e, como sabemos, quem vende à pressa vende mal. Por outro lado, parafraseando ainda Teixeira dos Santos, “quem melhor conhece cada devedor é o banco”, ou seja, é o seu credor e não compradores dessas dívidas de cobrança duvidosa, fundos ou veículos de titularização que as adquiriram por atacado.

E do ponto de vista legal? A perspectiva não é nada animadora! O quadro normativo português só aconselha aos bancos prudência, tempo e cómodas almofadas financeiras! Temos um sistema creditício incoerente, disperso, a vários tempos e que entre avanços e recuos só em casos excepcionais consegue livrar o credor do calvário da acção executiva!

O Código Civil veda à hipoteca qualquer hipótese de execução extrajudicial. O mesmo diploma, de mãos dadas com o Código Comercial, permite a adjudicação do penhor com simples convenção inter partes. Já o Código de Processo Civil prevê a adjudicação ao credor em qualquer dívida com garantia real, mas sem mecanismo próprio fora da acção executiva.

E a ‘caixa de pandora’ do pacto comissório parece abrir e fechar-se ao ritmo da legislação europeia que Portugal tem obrigatoriamente de transpor – ora para os contratos de garantia financeira ora para o penhor mercantil –, mas sem que o legislador queira ver que essa é a tendência internacional e que esse caminho não é disruptivo de um sistema garantístico como o nosso.

É imperioso repensar o sistema de garantias e respectiva execução. Em Portugal, os níveis de NPL poderiam reduzir-se sem vendas apressadas com a revisão do quadro legal e medidas tão simples como a aproximação do regime da hipoteca ao regime do penhor.

A simples revisão de uma norma do Código Civil seria (para já) bastante. Não se advoga rever toda a legislação que regula a matéria. Aliás, a elefantíase legislativa trouxe-nos até aqui. E este não é um bom lugar: nem para os grandes credores (bancos) nem para os pequenos credores anónimos que emprestaram dinheiro a familiares ou amigos e que também ficaram a arder

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.