Na semana passada o Governo anunciou as primeiras medidas no âmbito da anunciada “Reforma do Estado”.
Pelo que foi comunicado, o Governo visa fundamentalmente dar resposta a duas linhas de preocupação: a restruturação orgânica, iniciada pelo Ministério da Educação, no âmbito da qual se pretende identificar entidades que possam vir a ser fundidas, e a simplificação legislativa e administrativa, que incidirá sobretudo no redesenho de procedimentos para conferir maior celeridade, eficácia a eficiência à actividade da Administração Pública, incluindo a revisão dos Códigos do Procedimento Administrativo e da Contratação Pública e a simplificação dos regimes de licenciamento comercial, industrial e urbanísticos e de alguns actos societários. Pretende-se neste âmbito a “eliminação de pareceres desnecessários” e, em geral, reduzir os prazos de decisão, o que é visto como conduzindo a “facilitar a relação entre os cidadãos e os diferentes departamentos do Estado”.
Foram anunciadas para já duas medidas que serão concretizadas nos próximos tempos: a restruturação da Agência para a Modernização Administrativa que, com a nova denominação de “ARTE – Agência para a Reforma Tecnológica”, deverá ter uma função de liderança dinamizadora do desenvolvimento tecnológico dos sistemas de informação da Administração Pública, e um novo regime de mobilidade eléctrica que visa dar mais flexibilidade e simplicidade ao abastecimento de veículos eléctricos.
Não tenho quaisquer dúvidas quanto ao mérito dos objectivos definidos e aos respectivos méritos: a simplificação orgânica e a desburocratização são medidas necessárias e urgentes, e são instrumentos úteis numa estratégia de dar mais eficiência e eficácia à actuação do Estado, através da Administração Pública. Mas na realidade não traduzem uma verdadeira reforma do Estado, a menos que entendamos “reforma” como sinónimo de “reorganização”.
Na minha opinião, que tenho repetidamente afirmado nas páginas d’ O Jornal Económico, uma verdadeira reforma do Estado implica uma reflexão cuidada sobre que modelo de desenvolvimento queremos para o futuro do país. Essa refexão, que deve ser amplamente debatida para procurar gerar um consenso o mais amplo possível, para que perdure no tempo, obriga a que em primeiro lugar se defina o que queremos que o Estado seja e faça, partindo de um diagnóstico de situação inicial que descreva o que o Estado actualmente é, e faz, em todos os domínios e através dos diversos níveis de intervenção – central, regional e municipal, por via administrativa, regulatória, empresarial, etc. Poderemos perceber o que é que o Estado faz, mas não devia fazer ou devia fazer de modo diferente, e o que não faz, mas devia fazer. Ficarão assim identificadas áreas de intervenção, e será possível definir estratégias e medidas destinadas a atingir o desenho final que se tiver criado.
Este debate não é fácil, nem rápido, e exige a mobilização de um grande volume de recursos de informação, de capacidades intelectuais, e de vontade. Que é o que tem estado ausente nas tentativas de reforma que têm sido apresentadas, sucessivamente aplaudidas por quem as tiver desenhado e implementado por estar transitoriamente no poder, e criticadas e descredibilizadas por quem vem a seguir – porque, evidentemente, as iniciativas apresentadas são implementadas na base do exercício da maioria parlamentar, sem serem verdadeiramente consensualizadas. É este círculo vicioso que urge quebrar.