(Escrevo estas linhas na véspera de Natal, já de olhar fito no Novo Ano. Nunca fui grande admiradora da hipocrisia desta época por, desde cedo, me ter detido na facilidade com que o espírito que nos inunda nestes dois dias rapidamente acabar no caixote do lixo, ao lado do papel de embrulho dos inúmeros presentes que compramos por obrigação. Pelo contrário, sempre gostei da passagem de ano por a entender como a hipótese de um recomeço, em que os erros são superados e nos tornamos melhores. Estranho sinal dos tempos este, em que o sabor do presente é ultrapassado pelas expectativas que criamos em relação a um futuro que não sabemos como será. No final do dia, resta-nos fazer dele o que sonhamos porque, como diz o poema tão bem cantado, o sonho – ainda – comanda a vida e é esta capacidade que nos torna realmente humanos.)
Num mundo em que o populismo ganha espaço a cada instante e em que as reflexões são substituídas pelo instântaneo, opto por recuar umas décadas e pensar que há lições na História que não podem, de todo em todo, ser esquecidas. Não sigo pelo caminho mais fácil, gosto de pensar que não vergo ao politicamente correcto e esforço-me por tentar ter um trilho digno e justo.
Mais do que presentes de que não preciso, o que peço, não apenas agora mas todo o próximo ano, é uma sociedade mais atenta, mais sincera, enfim, mais humana, em que não nos esqueçamos que, no final, acabaremos todos da mesma forma, sem diferenças de maior. A morte tem a inegável vantagem de nos tornar a todos iguais e o grande desafio é percebermos isso durante a vida.
E, por isto e pelo muito mais que não cabe nestas linhas, declaro-me de olhos postos no futuro mas sem perder de vista o passado. Um povo sem memória é, sempre, um povo condenado. Como se usa dizer e menos praticar, interessa menos o destino final do que a viagem. Façamo-la certos de cada passo mas, acima de tudo, com a atenção também nos outros. E, se é certo que o caminho foi sempre para a frente, o sentido da vida é podermos aprender, tanto com os êxitos, como, principalmente, com as derrotas.
Encarar o futuro é, também, saber reconhecer o perigo que se esconde na demagogia e no incentivo ao ódio, ainda que sob a capa de protecção aos que nos estão mais próximos. Esse é o ensinamento que a História que nos dá a cada passo e que convém que não esqueçamos, sob pena de vermos realidades como Auschwitz ou os Gulags se repetirem.
Um excelente ano de 2020 para todos os que nos acompanham, em que os insucessos sirvam para nos levantarmos mais fortes e em que valores como a empatia e a verdadeira solidariedade se mantenham. Até lá.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.