Retomo alguns dados referidos aqui na semana passada, reforçando-os com mais informação. Como tínhamos visto, entre 2010 e 2021, os preços subiram 12% e o salário médio nominal bruto subiu 13%, de 1.244 euros para 1.405 euros mensais (considerando 14 meses). Isto corresponderia a uma estagnação do poder de compra, mas, infelizmente, em termos de salários líquidos, o resultado é pior: passámos de 958 euros para 1.021 euros, uma subida de apenas 7%, a que corresponde uma deterioração em termos reais de 5%.
Para o caso mais simples, solteiro sem filhos, a taxa de retenção na fonte de IRS, nestes escalões, subiu de 12% para 16,3%. Ou seja, mesmo para trabalhadores que ganham abaixo da média houve um aumento da carga fiscal pela parte dos rendimentos do trabalho, fora todos os outros aumentos de impostos, que empobreceu as famílias. A austeridade não tinha acabado?
No mesmo período as rendas subiram 45% em média, a partir de níveis que ninguém poderá dizer que eram acessíveis. Uma das prováveis explicações para esta subida, completamente desfasada da evolução dos salários, será a clara desaceleração no crescimento de alojamentos. Entre 2001 e 2011, o número de alojamentos subiu 12%, mas apenas 4% na década seguinte. O que significa também que a recuperação deste crescimento é a chave principal para tornar as rendas mais acessíveis.
Em 2021, foram efectuados 87 mil novos contratos de arrendamento cujo valor médio foi 6,08 euros/m2. Nos valores que se seguem, vou considerar um apartamento com 100 m2, por simplicidade, mas o leitor pode sempre considerar outras áreas se achar mais conveniente, sabendo que nas localizações menos dispendiosas é comum a superfície dos alojamentos ser superior.
Diríamos, então, que a renda média andaria pelos 608 euros no país, sendo de 521 euros no Norte (651€ na Área Metropolitana do Porto), 423 euros no Centro, 889 euros na Área Metropolitana de Lisboa, 397 euros no Alentejo, 686 euros no Algarve, 412 euros nos Açores e 632 euros na Madeira.
Isto significa que a renda média equivale a 60% do salário médio líquido, podendo admitir-se que quem ganha este montante se tenha que contentar com uma área inferior a 100 m2.
Há um aspecto curioso a salientar: dentro da A. M. do Porto há localidades com rendas abaixo da média nacional (Santa Maria da Feira, 427€; Gondomar, 575€) e isso não se verifica em nenhum dos municípios da A. M. Lisboa. Ou seja, no Norte há formas de escapar às rendas elevadas, mas isso não é possível na capital, ainda que esta área seja mais vasta.
Há quem possa pensar que as rendas são mais elevadas na região de Lisboa por aí os salários serem superiores, mas não é assim. Considerando o rácio entre as rendas e os salários, este é inferior à média nacional no Norte (93%), Centro (82%) e Alentejo (79%), mas superior à média na A. M. de Lisboa (126%) e Algarve (137%), sendo que neste último caso a ocupação de Verão distorce muito os dados.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.