Não era necessário entrarmos em confinamento para percebermos que a globalização deixou de manifestar a tendência de crescimento de que tanto se falava nos últimos anos. Mais, já há algum tempo que a desglobalização era a tendência marcante, no seguimento da desaceleração económica decorrente da chamada “Grande Crise Financeira”, a que se seguiu a tentativa de diminuição do exterior e o reforço da aposta na economia sustentável, normalmente associada a uma maior proximidade.

Estas evidências passaram a ser cada vez mais óbvias nas economias desenvolvidas que procuram, de há alguns anos para cá, um modelo de desenvolvimento económico mais assente no uso de novas tecnologias, por um lado, e na aposta em negócios de base local, por outro.

Pode julgar-se que esta mudança de paradigma começou a ter lugar com o fenómeno do “Make America Great Again”, baluarte que Donald Trump usou na sua campanha às presidenciais de 2016. Porém, a tendência para a reindustrialização de algumas economias, que estimulou a onda da desglobalização, já antes se fazia sentir. O presidente Obama manifestava uma preocupação evidente, no seu segundo mandato, com medidas cujo objetivo era a promoção da criação de empregos através do encorajamento ao retorno de algumas produções, antes subcontratadas, ao país.

A resposta não se fez esperar e, já em 2013, metade das maiores 200 empresas americanas havia respondido favoravelmente a estas medidas de reshoring, levando, assim, à criação de um valor em torno dos cinco milhões de empregos naquele país e reduzindo o desemprego entre 2 a 3%.

O reshoring é o processo de retorno à base a partir de onde as atividades eram antes realizadas: ou seja, antes de as empresas terem decidido produzir (total ou parcialmente) noutros países que não o de origem. Este processo recebeu um estímulo interessante não apenas por parte dos EUA, como já referido, mas também por parte de outras economias, que, com esta medida, começaram a valorizar não só a importância de uma maior proximidade aos seus clientes, como a possibilidade de beneficiarem de uma maior capacidade de reação e de encurtamento da cadeia de valor.

Para além disso, de realçar que, ao cabo de alguns anos de experiências com offshoring, algumas destas empresas podiam já contar com ganhos de aprendizagem, experiência no contacto com fornecedores de várias proveniências e maior proximidade aos centros de investigação e desenvolvimento. Estes fatores, juntos, estão também na base do desejo de implementação de melhores sistemas de inovação e qualidade. E isto já para não falar nas associações menos negativas de que se poderiam libertar por estarem, agora, a diminuir a produção dos seus produtos em países normalmente associados a um inferior “efeito de país de origem”.

De facto, para algumas empresas com marcas de renome, a excessiva dependência da produção em países associados a custos de trabalho reduzidos não produzia uma associação positiva. Por exemplo, ter uma gabardina da Burberry produzida no Reino Unido tem uma associação muito mais positiva para a marca do que anteriormente, dado que havia deslocalizado a sua produção para a China.

Fazer o reshoring, para além disso, permite às empresas estarem menos dependentes de eventos negativos, como os desastres naturais ou outros factos não controláveis com capacidade de colocar em causa as cadeias de abastecimento, como a existência de greves ou restrições de variada natureza, como, por exemplo, de entrar em determinado país.

Assim, é de esperar que esta tendência de retorno à base, e que redunda em protecionismo, acabe por marcar o passo, agora que a pandemia atingiu todas as economias mundiais. Não é de esperar, por isso, que nos próximos tempos se volte a assistir a uma globalização sem precedentes como aquela a que se assistiu até há pouco tempo atrás, com todos os prós e contras que lhe estão associadas. O que sucederá após a pandemia, só o tempo o dirá.