Os últimos 20 anos foram marcados pelo desaparecimento das grandes empresas portuguesas. A gestão focada num grupo de accionistas específico, nas ambições pessoais ou nos objectivos políticos, em detrimento do interesse da empresa causou prejuízos incalculáveis e anos de atraso à economia portuguesa. As empresas de bandeira nacional foram, literalmente, assaltadas.

Vem esta consideração a propósito da leveza como é tratado o que deve ser considerado como um desfalque à Caixa Geral de Depósitos (CGD), pago por todos os portugueses.

Neste caso em particular a responsabilidade não é apenas dos administradores, mas também do próprio Estado, que os nomeou. Deveria ter conhecimento da gestão das suas empresas e, a ser verdade, a inacção lesou o interesse público. Esse mesmo Estado tenta agora sacudir a água do capote ao recusar receber o resultado da auditoria, com base no sigilo bancário, o mesmo que se pretende abolir para conhecer quem tem mais de 50.000 euros nas suas contas.

Mais de dez anos a depois da concessão de crédito sem garantias, à revelia do departamento de risco, aprovadas pela administração, não existem ainda responsáveis. Mais de 1.200 mil milhões de euros concentrados em 64 créditos ficam sem apurar. O mais mediático foi o investimento em acções do BCP, quer pela própria CGD, quer financiando alguns grupos, sem garantias, fomentando uma tomada de controlo de um banco privado à custa do contribuinte.

Esta operação nunca foi bem explicada e não o foi porque não é do interesse dos deputados, que encerraram prematuramente a Comissão Parlamentar de Inquérito. Fica a pergunta: para que servem afinal os auditores se os seus avisos são ignorados, ou se ninguém olha para os conflitos de interesses pessoais e entre empresas, caso do BCP e da CGD.

Neste momento, a Caixa está capitalizada graças aos contribuintes e investidores que subscreveram obrigações, prometendo até, segundo o Orçamento do Estado aprovado para 2019, iniciar a distribuição de dividendos, numa ilusão óptica para as contas públicas.

Enquanto a consequência da irresponsabilidade política ou da gestão se cingir apenas a não ser reeleito, sem consequências económicas, sanções ou até a prisão de responsáveis, não teremos gestores à altura e capazes, uma vez que o sistema está mais vulnerável à captura por interesses.

Não é só em Portugal que o sector financeiro continua no centro das atenções da classe política. Na Alemanha, a ideia do governo alemão de fundir o Deutsche Bank com o Commerzbank não deixa de ser uma ironia na nova arquitectura europeia de supervisão bancária, que devia evitar a criação de conglomerados demasiado grandes para falir.

Este aspecto demonstra por si só que a zona euro pouco aprendeu com a crise financeira, e menos ainda a lidar com o peso que estas entidades de grande dimensão podem ter em termos de concorrência e de impacto económico, quando confrontadas com uma recessão ou crise nos mercados financeiros.

Enquanto os políticos não deixarem os mercados funcionar e mantiverem agendas escondidas, não podemos esperar uma sociedade melhor.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.