O colapso financeiro do Silicon Valley Bank (SVB) na passada sexta-feira, 10 de março, trouxe instabilidade aos mercados com especial incidência nas ações dos bancos norte-americanos e com os bancos europeus a sofrerem um efeito de contágio na segunda-feira seguinte, 13 de março.
Analistas da Schroders fizeram um diagnóstico do desenrolar desta situação: desde que o momento em que o banco anunciou a falência à incógnita em torno do futuro dos depósitos de investimentos das startups passando ainda pela reação dos mercados asiáticos e europeus.
O que aconteceu ao SVB?
Várias startups de tecnologia depositaram confiança e fundos no banco californiano, confiando que as somas avultadas estariam asseguradas. No entanto, o SVB investiu os depósitos das startups em títulos do Tesouro e títulos soberanos, só que quando a Reserva Federal (Fed) aumentou as taxas de juros, o valor dos títulos adquiridos caiu a pique.
Ora, quando as taxas de juros começaram a subir, as startups deixaram de ter o financiamento que recolhiam em anos anteriores e retiraram os depósitos guardados no banco da Califórnia para garantir financiamento.
Como não dispunha de cobertura para gerir a subida dos juros, o SVB teve de vender 21 mil milhões de dólares em títulos a 8 de março, tendo um prejuízo de 1,8 mil milhões de dólares. Depois da informação do prejuízo se ter tornado pública, os clientes correram para o banco de forma a tirar o dinheiro que lá estaria guardado, sem sucesso num primeiro momento.
E as empresas ficaram sem acesso ao dinheiro que amealharam?
Não, apesar dessa ter sido a primeira informação que surgiu. Dois dias depois de o banco fechar portas, o Tesouro dos EUA, a Fed e a Federal Deposit Insurance Corporation tranquilizaram os clientes e garantiram financiamento de emergência para proteger os depósitos dos clientes do SVB e também do Signature Bank, que foi arrastado pela mesma situação.
Qual a razão do risco de colapso não ter sido detetado antes?
Segundo a Schroders, tudo se deve a uma lei aprovada em 2018 que reverteu os regulamentos sobre os pequenos e médios americanos. O rápido crescimento do SVB foi outro fator que os reguladores não tiveram em conta.
O especialista do sector global de finanças da Schroders, Andre Reichel, admite que “existem questões compreensíveis sobre as razões da administração do SVB e dos regulares não terem identificado riscos potenciais” em torno do investimento realizado pelo banco.
“Uma resposta é o rápido crescimento do SVB. Há três anos, o SVB era um banco relativamente pequeno. O seu balanço triplicou muito rapidamente como resultado do fluxo de dinheiro para os sectores de tecnologia e de capital de risco durante a pandemia. Mas a mentalidade da administração não acompanhou o facto do banco se ter tornado um negócio muito diferente e muito maior num curto espaço de tempo”, explica Reichel.
Mas o banco não angariou dinheiro em 2023?
Sim. O SVB tinha recolhido 90 milhões de euros na última ronda de angariação de fundos, a 8 de março, dois dias antes do colapso financeiro. Esta foi também a ronda em que o banco angariou mais dinheiro nos últimos meses.
Desde o início do ano, o SVB angariou 252 milhões de euros através das startups de tecnologia e empresas emergentes no meio, segundo o Blockchain Centre. No entanto, este dinheiro não foi suficiente para a instituição financeira evitar a falência depois de maus investimentos da sua parte.
A crise já se encontra contida ou terminou?
Ainda existem algumas preocupações em relação a este tema, dada a falta de escrutínio a bancos mais pequenos que foi apontada como uma das razões para o colapso do SVB.
“A questão permanece se existem outros bancos em risco. Alguns bancos mais pequenos com depósitos concentrados podem estar vulneráveis”, adianta David Knutson, gestor de produtos de rendimento fixo da Schroders.
A multinacional de gestão de ativos está a analisar “cuidadosamente o impacto que o aperto quantitativo (cancelamento do programa de compra de títulos da Fed), juntamente com o rápido aumento das taxas, está a ter nos fluxos de depósitos”. A Schroders vai continuar a acompanhar toda a situação, focando-se na disponibilidade e procura de crédito, mas sente-se “confortável com a liquidez dos grandes bancos americanos”.
Já nas palavras de Andre Reichel: “É muito cedo para concluir que a crise acabou”. Ainda assim, o especialista admite que existem alguns bancos que podem estar vulneráveis à crise, embora agora se saiba que existe um backstop. “Mesmo que outro banco mais pequeno falhe, o sistema amplo está protegido”.
Então, onde é que as startups vão depositar o dinheiro que angariam?
Na verdade, para onde quiserem. Muitas startups escolheram o SVB devido ao acesso a serviços empresariais mais amplos do que aqueles oferecidos pelas maiores entidades bancárias. Mas a Schroders adianta que algumas fintechs viram um aumento de volume após o colapso da entidade bancária.
“Várias empresas transferiram capital do SVB para fintechs habilitadas, como a Revolut, durante a incerteza da semana passada. A velocidade das transferências demonstra como as empresas que trabalham com tecnologia são eficientes na abertura de novas contas, pois podem trabalhar 24 horas por dia, sete dias por semana”, explica Tim Creed, responsável de investimentos de capital privado da Schroders Capital.
Para Justin Bisseker, analista de banca, a única certeza atualmente é que as empresas estão a dar prioridade à segurança em detrimento de outros fatores quando o assunto é escolher um banco. “Isso é uma vantagem para os maiores credores”, uma vez que a redução da concorrência nos depósitos pode significar menos obrigações.
Depois deste aviso, os investidores devem prestar mais atenção à concentração dos seus depósitos?
Pode ser um aviso, sim. Ainda que o SVB fosse o 16.º maior banco dos EUA, era o mais importante para o mercado tecnológico, concentrando mais de 50% das startups.
“Este banco era demasiado grande para falhar em Silicon Valley e na indústria de capital venture dos Estados Unidos, mesmo que fosse um banco pequeno”, explica Nils Rode, responsável de investimentos na Schroders Capital. Ainda assim, “a exposição da indústria a este banco era extremamente elevada, com mais de 50% a escolherem-no. Esse é um problema que não estaria no radar de muitas pessoas, mas vai passar a estar”.
Rode lembra que as startups e empresas no sector tecnológico são grandes motores de crescimento para a economia dos Estados Unidos e, caso estas empresas não conseguissem aceder aos seus depósitos (por conta da rápida resposta do Tesouro e Fed), existiam fortes probabilidades de uma explosão de grande dimensão no sector.
Qual o impacto nos bancos europeus e asiáticos?
O colapso do SVB só chegou aos mercados europeus e asiáticos na segunda-feira, uma vez que, quando se tornou conhecido, as negociações em bolsa já tinham terminado. No entanto, quando iniciaram as negociações na segunda-feira, gerou-se um crash e temeu-se o pior na Europa.
As negociações asiáticas encerraram mistas, embora o Japão tenha sentido o peso do sector financeiro, com os índices a perder mais de 1%. Já na China e em Hong Kong, as bolsas encerraram em terreno positivo, depois do anúncio de que a política monetária se iria manter estável por o governador do banco central e os ministros das Finanças e do Comércio se manterem nos cargos.
Mas se a Ásia conseguiu desviar as atenções, o mesmo não aconteceu na Europa. Na segunda-feira, as bolsas europeias registaram a maior queda desde meados de dezembro, bastante influenciada pelo sector da banca, que teve o pior dia do último ano.
Só o Stoxx 600 caiu 2,42%, com a banca e serviços financeiros a comandaram as perdas. Já o Euro Stoxx 50 desvalorizou 3%, enquanto Milão recuou 4,03%, Madrid perdeu 3,51% e Frankfurt caiu 3,04%, Paris cedeu 2,90%, Londres depreciou 2,58% e Lisboa desvalorizou 2,15%, atenuando, de alguma forma, as perdas na Europa.
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