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Respostas Rápidas. Qual o legado económico deixado por Angela Merkel?

É a líder europeia que se encontra há frente de um governo há mais tempo. Quando se tornou chanceler da Alemanha, em 2005, negociava a nível internacional com Jacques Chirac em França, Tony Blair no Reino Unido, George W. Bush nos EUA ou José Sócrates, em Portugal.
29 Outubro 2018, 19h22

“Ela vai deixar um país mais aberto e mais feliz ao seu sucessor – provavelmente um que será ela a escolher”, escrevia o jornalista especializado em economia alemã, Leonid Bershidsky, num editorial da Bloomberg em março, sobre a chanceler Angela Merkel. Essa altura está prestes a chegar já que a alemã, anunciou esta segunda-feira, que não se irá recandidatar à liderança do partido CDU.

Angela Merkel é a líder europeia que se encontra há frente de um governo há mais tempo. Quando se tornou chanceler da Alemanha, em 2005, negociava a nível internacional com Jacques Chirac em França, Tony Blair no Reino Unido, George W. Bush nos EUA ou José Sócrates, em Portugal. Desde então, muito mudou na conjuntura económica e financeira e Merkel ajudou a desenhar parte das alterações.

O que mudou na economia alemã desde a chegada de Angela Merkel?

Após o pico de crescimento económico de 2,2% em 2017, o Produto Interno Bruto (PIB) da Alemanha deverá expandir 1,9% tanto este ano como no próximo, de acordo com as projeções da Comissão Europeia. No entanto, nem todos os anos de liderança Merkel foram de crescimento. No ano em que a chanceler chegou ao poder, a economia cresceu 0,7%, mas quatro anos depois sofria uma contração superior a 5%.

Nesse ano, a chanceler alemã anunciou o maior programa de estímulos económicos na Alemanha depois da segunda guerra mundial, através a intervenção pública em empresas e indústrias, incluindo a aquisição de 25% do capital do Commerzbank para evitar uma crise da banca. No entanto, garantiu que não iria implementar medidas de forma indiscriminada ou sem foco. Os alemães parecem ter concordado, já que Merkel voltou a ser eleita. O país voltou ao crescimento económico e, em 2010, expandiu mais de 4%.

Qual foi a posição da chanceler alemã sobre a crise da dívida?

A crise das dívidas soberanas rebentou na Europa, há quase dez anos, numa altura em que a Alemanha lidava com a sua própria recuperação após a recessão. Angela Merkel decidiu libertar cerca de 400 mil milhões de euros de dinheiro público, apenas em 2012, para ajudar os países em stress na zona euro. No entanto, o papel da alemã na crise não foi pacífico até porque, os bancos alemães detinham, na altura, grande parte da dívida pública da Grécia, pondo o destino grego nas mãos da chanceler.

Merkel endureceu o discurso e deixou claro aos países do sul da Europa – incluindo Portugal, mas especialmente a Grécia – que teriam de aplicar medidas de austeridade e cumprir metas, sob pena de destruírem toda a zona euro. Na negociação do terceiro resgate a Atenas, Merkel e o então ministro das Finanças Wolfgang Schäuble chegaram mesmo a ser acusados de chantagem, pelo partido de extrema esquerda alemão Linke.

O que aconteceu quando Portugal pediu ajuda externa?

No caso de Portugal, o discurso de Angela Merkel foi menos duro, mas não isento de avisos. Num encontro com o então primeiro-ministro português Pedro Passos Coelho, a chanceler dizia, em 2012, que que a Alemanha estava disponível para ajudar Portugal. “Sei que isto é muito difícil para algumas pessoas – o desemprego é elevado, especialmente entre os mais jovens -, portanto a Alemanha quer apoiar Portugal, em particular na formação profissional”, disse.

No entanto, o apoio vinha com condições: Portugal tinha de se manter o “bom aluno” dos países em crise, com a implementação de medidas de austeridade que cumprissem os requisitos dos credores internacionais. “Sinto uma grande determinação aqui em Portugal para ultrapassar as dificuldades”, acrescentou na altura. Uma das declarações mais polémicas e criticadas pelos partidos da oposição portuguesa foi sobre o número elevado de licenciados no país.

Qual o papel de Merkel da reforma da zona euro?

Quando Angela Merkel chegou ao poder, a moeda única já era uma realidade, mas a política tem ajudado a construir o projeto. A Alemanha tem exercido dominância no processo de decisão – de forma mais ou menos discreta -, o que se tornou mais partilhado com a chegada de Emmanuel Macron à presidência de França. Uma questão que ressurgiu nos últimos meses e que se tornou num dos pontos em que a chanceler não abdica é o ministro das Finanças comum.

“O euro não foi criado para ter um ministro das Finanças comum”, disse a alemã em agosto. Um ministério das Finanças deve ter em primeiro lugar o seu próprio orçamento, que hoje não existe na zona euro, e os “mecanismos de controlo correspondentes”, que não podem ser assumidos pelo Parlamento Europeu, uma vez que nem todos os 28 países da União Europeia fazem parte do grupo da moeda única, recordou ainda a chanceler.

Como Merkel teve impacto na recente onda protecionista?

Guerra comercial foi uma expressão que entrou no léxico global, trazido pelo presidente dos EUA, Donald Trump. A implementação de medidas protecionistas pelo líder norte-americano levantou dúvidas sobre uma escalada de tensões que marcasse uma cisão em relação ao comércio livre. Angela Merkel tornou-se a voz da resistência a Trump, marcando uma posição clara e em nome de toda a Europa: os EUA haviam deixado de ser um “amigo”.

Em julho do ano passado, Merkel deixou cair o termo “amigo” para classificar os EUA no programa eleitoral para as próximas eleições alemãs, quando quatro anos antes eram considerados “o amigo mais importante” da Alemanha fora da Europa. Desde então, as relações entre os dois líderes tem-se mantido cordial, mas a chanceler não se tem coibido de criticar os EUA e Donald Trump.

Como é que Merkel mudou a energia europeia?

A auto-proclamada ambientalista anunciou, em 2011 após a crise nuclear na cidade japonesa de Fukushima, o objetivo de acabar com a energia nuclear até 2020. O plano, que ficou conhecido Energiewende (ponto de viragem da energia), é um dos grandes legados de Angela Merkel no campo energético, de forma positiva.

Mas nem tudo na política energética de Angela Merkel foi positivo. O recurso do país ao gás russo tem gerado duras críticas, especialmente devido à construção em curso de um segundo gasoduto que liga a Alemanha à Rússia pelo mar Báltico. Apesar das críticas, a chanceler tem mantido o discurso de que nem o país nem o continente ficarão dependentes de Vladimir Putin.

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