A social-democracia implodiu no panorama político espanhol como consequência do atribulado processo de formação de governo, o que resulta particularmente grave numa fase de transformação profunda da economia que está a ter efeitos fraturantes na sociedade.

A social-democracia desmoronou-se como consequência das contradições internas do PSOE, incapaz de conjugar as pressões territoriais com o desgaste do exercício de poder que o levou a incubar alguns dos protagonistas da debacle económica e social que o país sofreu nos últimos anos. Espanha padece de uma crise de exemplaridade enorme, alimentada por inúmeros casos de corrupção que, junto com o enorme desemprego e a flagrante pobreza e exclusão social, faz do país uma anomalia dentro da União Europeia, em cujo âmbito compara negativamente com quase todos os países, incluindo Portugal.

Nesse cenário, o PSOE não resistiu às forças tectónicas vindas, pela direita, de um bloco conservador muito mais homogéneo e resistente à pressão social pelos casos de corrupção; e, pela esquerda, das novas formações políticas nascidas do ativismo social, sem um passado censurável e, por isso, abandeiradas de um discurso moralizador e, à luz dos resultados, também tremendamente mobilizador.

Como acontece também em Portugal e em todo o mundo ocidental, a sociedade espanhola está a atravessar uma transformação profunda do seu modelo económico. A linearidade social e as expectativas de progresso das pessoas comuns desvaneceram-se pelo impacto da transição acelerada da economia para um mundo digital e global, que requer uma menor quantidade de mão de obra com uma qualificação indisponível no mercado e frequentemente inatingível para os que perderam os seus empregos mais tradicionais. Nesse cenário, é preciso redobrar esforços para garantir não só a promoção das ‘startups’ tecnológicas e do empreendedorismo, do investimento empresarial e, no geral, da iniciativa privada, que é fundamental, mas também assegurar a redistribuição do capital criado pela inovação sob o risco do afundamento irreversível dos colectivos menos capacitados e proativos, e consequente instabilidade social.

É este o contexto em que a falta de uma força social-democrata pode ser particularmente penalizadora para o país, fomentando uma desigualdade económica crescente que alimenta a demagogia e o “involucionismo” hoje bem exemplificado pelos líderes xenófobos, ultranacionalistas ou antiglobalização que protagonizam os sucessivos processos eleitorais.

A economia é fundamentalmente uma ideologia e não uma ciência. A fé cega no “tecnocapitalismo”, junto com os novos modelos de negócio, supostamente colaborativos mas socialmente regressivos, alimentam à velocidade da luz desequilíbrios sociais que cristalizam numa globalização da desigualdade.

São tempos maximalistas, em que tudo aparenta ser branco ou preto. Mas, como sabe quem já acumula muitas vivências, a realidade é sempre cinzenta, com alguns toques de cor que a todos cabe a responsabilidade de acrescentar.