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Riscos deflacionários agravam-se na China à chegada do Ano Novo Lunar

O índice de preços no consumidor (IPC), que é o principal indicador da inflação, continuou a desacelerar em dezembro para 0,1% e a subida acumulada de preços em 2024 foi de apenas 0,2%, agravando as pressões deflacionistas na segunda maior economia do mundo.
25 Janeiro 2025, 17h46

O risco de deflação na economia chinesa agravou-se, suscitado por uma profunda crise imobiliária, que afetou o investimento e o consumo, numa altura em que o país se prepara para entrar no novo ano lunar.

O índice de preços no consumidor (IPC), que é o principal indicador da inflação, continuou a desacelerar em dezembro para 0,1% e a subida acumulada de preços em 2024 foi de apenas 0,2%, agravando as pressões deflacionistas na segunda maior economia do mundo.

A deflação consiste numa queda dos preços ao longo do tempo, por oposição a uma subida (inflação). O fenómeno reflete debilidade no consumo doméstico e investimento e é particularmente perigoso, já que uma queda no preço dos ativos, por norma contraídos com recurso a crédito, gera um desequilíbrio entre o valor dos empréstimos e as garantias bancárias.

Outro dos efeitos é o de levar ao adiamento das decisões de consumo e investimento em resultado de expectativas de preços mais baixos no futuro, podendo criar uma espiral descendente de preços e procura difícil de inverter, afetando a economia por inteiro.

A queda dos preços começou em 2022, com a desvalorização do ativo mais importante na China: o imobiliário residencial. Desde que Pequim liberalizou o setor na década de 1990, os imóveis passaram a constituir o principal veículo de investimento das famílias chinesas, levando a um ‘boom’ na construção, que transformou as cidades do país asiático.

Essa estratégia económica parece agora ter ido longe demais.

Uma viagem de comboio pela China permite vislumbrar milhares de torres vazias ou inacabadas. Diferentes analistas calculam existir atualmente no país propriedades vazias suficientes para abrigar mais de 90 milhões de pessoas – cerca de nove vezes a população portuguesa.

“Houve muito crescimento fictício na China”, observou Michael Pettis, professor de teoria financeira na Faculdade de Gestão Guanghua, da Universidade de Pequim, à agência Lusa.

“O excesso de investimento em todo o tipo de projetos de construção não produtivos inflacionou o crescimento durante vários anos”, descreveu.

Agora, a perspetiva de uma queda prolongada nos preços dos imóveis levou à perda de confiança dos consumidores e investidores e a fuga para alternativas mais seguras.

Produtos com capital garantido, como os depósitos a prazo, tornaram-se a escolha preferida dos aforradores, o que levou o banco central da China a reduzir as taxas de juro, visando incentivar a alocação de capital na economia.

Os depósitos a prazo nos bancos estatais pagam atualmente 1,6% ao ano, em comparação com mais de 4%, há cinco anos.

Com poucos ativos seguros disponíveis, os bancos, as seguradoras e os gestores de fundos têm acumulado títulos de dívida pública, diminuindo a sua rentabilidade. As obrigações do Estado chinês a dez anos rendem agora cerca de 1,6%.

“Um dos fatores é a expectativa entre os investidores de que serão decididos cortes nas taxas diretoras [definidas pelo banco central], dado que os últimos dados sobre a atividade económica permanecem fracos e as medidas políticas anunciadas até agora parecem não ter conseguido impulsionar as expectativas de crescimento”, escreveu James Reilly, analista da Capital Economics, num relatório difundido na semana passada.

“Isto ajuda a explicar porque é que os rendimentos de curto prazo também caíram, com o rendimento [das obrigações] a dois anos a descer para 1%”, apontou.

Finalmente, quanto ao imobiliário, situação é particularmente agravada pela circunstância da população chinesa ter entrado num acelerado processo de declínio.

A população encolheu em 2024 pelo terceiro ano consecutivo e estimativas da ONU preveem que caia para menos de metade do número atual até 2100.

“As mulheres estão mais conscientes”, explicou Zhao Hua, uma chinesa de 28 anos natural de Pequim, à Lusa. “A desigualdade de género continua a ser profunda na China: os homens querem uma família tradicional, na qual a mulher toma conta dos filhos e das tarefas domésticas”, acrescentou.

Várias jovens mulheres chinesas ouvidas pela Lusa sublinharam a discrepância entre esse tipo de mentalidade com as expectativas de uma sociedade que se modernizou e urbanizou a um ritmo sem paralelo na História moderna.

Segundo o Banco Mundial, em 1980, apenas 19,4% da população chinesa vivia em zonas urbanas. Em 2023, a taxa ascendeu a cerca de 66%.

Recorrer à imigração para contrariar a queda populacional e estimular o imobiliário residencial parece estar excluído: a China define-se como sendo um país de “não-imigração”. Pequim não reconhece a dupla nacionalidade. A atribuição de cidadania é baseada no princípio “jus sanguinis” (direito de sangue), podendo apenas ser atribuída a quem tem ascendência chinesa.

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