O novo Regulamento n.º 7/2023 da CMVM – Regulamento do Regime da Gestão de Ativos ou RRGA representa o fim de um ciclo na regulação dos organismos de investimento em Portugal. Para o compreender, importa recordar que o processo de revisão do regime dos fundos de investimento se iniciou em há mais de dois anos, em 2021, com um processo de consulta pública promovido pela CMVM relativo ao Regime da Gestão de Ativos (RGA).

Após um processo de consulta pública bastante participado, seguiu-se, em 16 de janeiro de 2023, a publicação da Lei de Autorização Legislativa que conferiu poderes ao Governo para legislar nos temas reservados nesta matéria. Finalmente, em 28 de abril de 2023 foi publicado o DL 27/2023, que procedeu nomeadamente à revogação dos diplomas que antes regulavam os organismos de investimento coletivo em geral e o capital de risco.

Neste processo, a CMVM indicou os seguintes objetivos da reforma: incremento da coerência regulatória; espaço mais amplo ao princípio da proporcionalidade; redução da complexidade do regime; diminuição do goldplating; reforço da competitividade e atratividade do mercado nacional; coerência e proporcionalidade da regulação; preferência da supervisão ex post sobre a supervisão ex ante; e simplificação da regulação.

O RRGA desenvolve regulamentarmente o RGA e procura dar continuidade às linhas mestras deste diploma, em termos formais e em termos substantivos. Importa, por isso, avaliar em que medida o regulamento agora aprovado se mostra inteiramente alinhado com as diretrizes legislativas de maior flexibilidade e de supervisão ex post.

A este respeito, quanto à primeira vertente, tenha-se presente a ampliação da plasticidade dos documentos constitutivos, a que se contrapõe todavia a padronização de documento único informativo, aplicável a i) OIC abertos que não se dirijam exclusivamente a investidores profissionais, ii) OIC fechados objeto de oferta pública, e iii) OIC fechados que não se dirijam exclusivamente a investidores profissionais, nem sejam objeto de oferta pública e cujo valor mínimo de subscrição, por investidor, seja inferior a 100.000 euros. Soma-se que o conteúdo do contrato de comercialização passa a ser, no essencial, determinado pela autonomia privada das partes.

O RRGA mostra-se, porém, mais restritivo da comissão de gestão variável de OIC abertos. A este respeito, crê-se que o importante é assegurar a plena comparabilidade dos custos e encargos e políticas transparentes na sua fixação, ao invés de estabelecer uma intromissão direta nas comissões cobradas por gestoras.

Por seu turno, o regulamento encontra-se talhado para a supervisão ex post. Por esse motivo, existe um foco importante nas novas políticas que devem ser preparadas e adotadas pelas sociedades gestoras – políticas de custos e encargos, política de gestão de liquidez e política de resgate de OIC abertos. Salienta-se, ainda, a determinação de regras mais granulares sobre avaliação de ativos.

Outro domínio em que o RRGA insiste particularmente é o dos registos a cargo das sociedades gestoras. Estas devem proceder nomeadamente ao registo das decisões estratégicas e operacionais respeitantes à política de investimento e da respetiva execução, assim como ao registo atualizado de clientes a quem presta serviços de intermediação financeira.

Como etapa regulatória que assinala o fim de um ciclo, ao RRGA seguir-se-á necessariamente uma pausa legislativa nestas matérias. Mas esta pausa não se prologará por muito tempo, já que o pacote da Comissão Europeia sobre Retail Investment Strategy determinará importantes repercussões na área da distribuição de organismos de investimento coletivo. E nesse âmbito antecipa-se que as opções regulatórias, com interferência direta no modelo de distribuição dos fundos de investimento em Portugal, possam revelar-se (bastante) menos consensuais.