Existem cargos cuja responsabilidade, especificidade e visibilidade exigem discrição, desde logo àqueles que os ocupam, além de competência para um correcto exercício do seu magistério. Sejam eles nomeados ou escolhidos pelo governo, ou por concurso público, deverão sempre tudo fazer para evitar ruído e alarido, que em nada contribuem para um desempenho sem reticências e que, pelo contrário, acrescentam dúvidas e outras questiúnculas, a todos, particularmente aos que se não revêm em comportamentos censuráveis para o cargo.
Vem esta apreciação a propósito dos constantes movimentos de ruído, diria mais, de estridente ruído, que o actual governador do Banco de Portugal (BP), tem causado e arrastado consigo, ao longo do tempo que tem exercido o seu mandado. Sempre critiquei a sua escolha para o cargo. A governação Sócrates cometeu o primeiro erro ao nomeá-lo, e a governação Passos Coelho insistiu no mesmo erro, quando propôs a sua recondução por mais um mandato.
Nunca encontrei que este governador tivesse perfil para um cargo tão importante. Certamente, e em minha opinião, existiam outras pessoas com perfil mais ajustado às exigências que a função compagina, e que teriam certamente um desempenho positivamente bastante distinto. Não me refiro ao último “ruído” a propósito da Caixa Geral de Depósitos – este foi só mais um e a necessitar de explicação mais convincente.
Recordo todo aquele estridente ruído que andou à volta da Comissão Parlamentar de Inquérito ao Banco Espírito Santo (BES), de onde este governador saiu bastante maltratado. Recordo aqui uma passagem da conclusão dessa Comissão: “Não é a primeira vez que o BP falha na detecção, prevenção e resposta a problemas sérios na banca portuguesa, recordando os caso do BPN e do BPP. A eficácia das actividades de inspecção permanente do BP nos bancos carecem de uma reanálise quanto à sua eficácia, capacidade de identificação precoce de sinais de alarme ou de garantia da implementação de determinações do próprio BP”.
Para não falar da acta rasurada do Banco Central Europeu e apresentada pelo governador do Banco de Portugal à Comissão Parlamentar de Inquérito do BANIF – mais ruído. Ora, com tanto ruído, não entendo como é que o governador do BP encontra que tem condições para continuar na função!
Uma posição de governador de qualquer banco central deve ser, por excelência, uma posição discreta. Exige uma postura inatacável por parte do titular do cargo. E o que é que tem acontecido, pelo menos desde o BES? Um coro de protestos, não só no Parlamento mas na praça pública, na imprensa, nos fóruns próprios de debate, no sentido do governador sair pelo seu próprio pé. Será que não entende que está a mais (há muito tempo) na função?
Não sei se lhe assiste razão ou se, pelo contrário, deveria ser culpabilizado. Não me cabe a mim fazer esse juízo de valor. O que sei é que, com tanto ruído que impende sobre o governador, até para ressalva do seu bom nome, dignidade e honorabilidade, o caminho mais adequado que deveria ter seguido há muito, era o da saída pelo seu próprio pé. Porque com esta intransigência, é a própria instituição que acaba também por ser atingida. Mas o governador parece não entender esta realidade.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.