Um homem no estado indiano do Uttar Pradesh enganou-se a votar. Em vez de pressionar o botão que tinha desenhado um elefante, o símbolo do Bahujan Samaj Party (usam-se os símbolos além dos nomes dos partidos por causa dos analfabetos), carregou acidentalmente no botão com a flor de lótus do Bharatiya Janata Party. Vai daí, ficou tão frustrado que cortou o dedo, talvez para não se voltar a enganar.

Pawan Kumar (é o seu nome) é um dalit, ou “intocável”, um “shudra”, membro da casta inferior de entre as quatro que compõem a população indiana, e as eleições é um dos raros momentos em que o que ele faz vale tanto como o que faz qualquer outro indiano. Este erro foi, portanto, um momento de intensa frustração, daí a sua decisão drástica, mesmo que irracional.

Esta coisa da política e das votações é talvez a única parecida com a irracionalidade e a estupidez do que acontece no mundo do futebol. Uma citação frequentemente incorreta de John Stuart Mill é que ele tratou os conservadores por “the Stupid Party”; na verdade, ele referiu-se a eles como “the Stupidest Party”, o que mostra o que ele pensava dos outros partidos. Claro que aqui referia-se sobretudo aos líderes, mas admitindo que há semelhança entre animais e seus donos, a afirmação vale também para baixo.

E é igualmente estúpido datar o que Mill disse. Se houver alguma veleidade em afirmar que hoje não é assim, basta lembrar Dan Quayle e Bush filho para sentirmos que não é preciso ser uma luminária da intelectualidade para triunfar na política. E se Trump não é capaz de enumerar os 50 estados dos EUA, Shenkman conta-nos que só 40% dos americanos sabe quais são os três ramos do poder, menos de metade sabe que país largou a bomba atómica, só 25% sabe que liberdades são garantidas pelo First Ammendement, mas em contrapartida mais de 50% sabe os nomes de pelo menos dois membros da família Simpson.

Se dúvidas houver sobre a aplicação disto ao lado de cá do Atlântico, é ler o “stupid is as stupid votes” de Toby Young no “The Spectator” de maio de 2017 – ele aponta alguns políticos que, nas suas palavras, não foram nenhuma “brainbox” e em particular de Corbyn diz que “em termos de QI, está pelo menos dois desvios-padrão abaixo do seu antecessor.”

O último estado do exercício é o político que chama estúpidos aos seus próprios eleitores. Michael Cohen conta que Trump disse um dia “black people are too stupid to vote for me”, mas que muitos votaram, votaram, apesar do insulto. Outras pérolas suas são, sobre ele próprio, “I would give myself an A+” e, sobre os EUA, “we are a dumb country”.

O que faz as pessoas votar em quem os insulta, a versão política do masoquismo? Talvez a vontade de fazer sangue, cortar com uma realidade que reprovam. Ou cortar, apenas – voltemos a Kumar, no Uttar Pradesh. Que parte do corpo acham que Trump deveria cortar, por aquilo que diz de quem vota nele? E no que acham que os americanos votariam, quanto ao que lhe cortar, a ele, Trump?