Quando eu era garoto via na televisão, a preto e branco, o meteorologista Anthymio de Azevedo explicar, deslocando num mapa do Atlântico as letras A e B, como o anticiclone dos Açores provocaria sol e alta temperatura nos dias vindouros. A tal ponto que acreditava piamente que o verdadeiro dono do tempo não era São Pedro mas o mágico Anthymio. Podíamos, era seguro, jogar à bola no pátio da Escola Manuel da Maia, em Campo de Ourique.
Hoje, pelas 21 horas, vejo atentamente o “Tiempo” no canal TVE 24, ou seja na televisão pública espanhola, se quero saber da chuva ou do vento na próxima semana. Mónica Lopez encarrega-se com folga e pedagogia de nos explicar o que vai acontecer nos próximos dias, temperaturas, humidade, mapas, fotografias de satélite e por aí fora. E até dá explicações sobre os (raros) falhanços das previsões. É claro que tenho de deduzir um bocadinho para perceber o que vai acontecer no território nacional, porque a informação termina na fronteira, como é óbvio.
Isto para dizer que não existe entre nós uma informação meteorológica rigorosa e completa em qualquer dos canais televisivos. A RTP como canal público tinha obrigação de ter mantido esse serviço. Pelos vistos acabou com ele vai para 20 anos e não tenciona recuperá-lo. O que é incompreensível considerando a necessidade cada vez mais óbvia, à conta das mudanças climáticas, de termos uma informação competente na matéria. Acresce que não é sequer um programa com pouca audiência. Pelo contrário, os espaços sobre a previsão do tempo são dos mais vistos em todos os canais informativos.
Mas não só não existe essa informação como aquela que o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) nos faculta no seu portal, para quem se interessa, parece ter enveredado, nos últimos tempos, pelo caminho da adivinhação. Soube-se a semana passada a propósito da nova catástrofe, que o Governo teria recebido um aviso do IPMA, com 3 dias de antecedência, de que o dia 15 de Outubro seria o mais perigoso do ano, acabando por não fazer o trabalho de casa. É possível (com este Governo tudo é possível).
Mas o que sei de ciência certa que, nesse mesmo dia 15, o IPMA enviou um alerta relativo à região de Lisboa quanto à previsão de “chuva forte acompanhada de trovoada” para o período entre as 3 e as 21 horas do dia seguinte, 16. Recebi esse aviso na minha caixa de correio electrónico e constatei que durante toda essa segunda-feira (pelo menos entre as 3 e as 21h) não caiu um pingo de chuva em Lisboa. Como havia visto o “Tiempo” da TVE na noite de dia 15, que só confirmava a passagem da frente fria no território nacional para terça-feira, ignorei o guarda-chuva mas não deixei de me interrogar sobre as razões de tão grosseiro erro de previsão.
Não encontro resposta. As previsões são hoje alicerçadas em imagens de satélite cada vez mais sofisticadas e em poderosas bases de dados, pelo que o erro é (ou deverá ser) cada vez menor. Infelizmente não é a primeira, nem a segunda, nem a terceira vez que o IPMA falha. No balanço de responsabilidades do pós-Pedrógão não há uma linha sobre o IPMA, pelos resumos que leio nos jornais. Será que não as teve? Como mero curioso dos fenómenos meteorológicos e da ciência que os estuda, o mínimo que posso dizer perante o cenário descrito é que sinto saudades de Anthymio de Azevedo!
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.