O atual processo de mudança das nossas vidas por causa da pandemia proporciona-nos já algumas reflexões. A significativa alteração dos hábitos, as novas vivências de bairro e de vizinhança, as relações familiares, a toma das refeições ou mesmo com as pessoas com quem nos cruzamos.
Esta mudança tão radical, tão perene e absoluta mereceu abalizados testemunhos de preocupação de especialistas em saúde mental. As intervenções manifestavam o impacto a sofrer pela mudança radical de comportamentos. Estatísticas são brandidas sobre os efeitos do isolamento e do distanciamento social impostos pelo receio do alastramento da doença. E apesar dos receios de divórcios, separações, violências e atos desesperados, não há registos que tal tenha sucedido, pelo menos com impacto público notório.
Os portugueses, perante este desafio, têm sido elogiados um pouco por todo o lado. Não apenas aceitaram as restrições, como em muitos casos o assumiram antes de terem sido formalmente decretadas. E assim o têm cumprido com maior zelo e compreensão que outros povos pelo mundo fora, dando provas de civilidade exemplar.
Num plano diametralmente oposto, a economia tem mostrado uma fragilidade tremenda. As empresas atingidas abruptamente pela efetiva travagem dos seus negócios, mostram grande dificuldade em renascer.
Em casos sucessivos, o efeito dominó tem sido atroz. Turismo, restauração, alojamento, transportes e viagens, agricultura e imobiliário constituem domínios interligados que hoje sofrem as agruras do encerramento e as dificuldades do recomeço. Em consequência, milhares de pessoas foram lançadas no desemprego, com um impacto social tremendo e retrocesso no processo de recuperação encetado há cerca de uma década, que nos fez igualmente merecer admiração pelo esforço, empenho e resultados alcançados.
Este panorama conduz-nos à constatação de que o crescimento foi excessivamente assente no desenvolvimento de um setor volátil que evidenciou gritante falta de sustentação da organização económica, numa evidente descapitalização das empresas que exigem hoje acesso a um mercado de crédito, onde as empresas já se encontravam profundamente embrulhadas.
Neste momento de retoma , os efeitos sobre a vida das empresas e o desempenho do país vai ser bem mais prolongado e doloroso do que a apregoada vivacidade da economia portuguesa nos últimos cinco anos. Comparando a saúde mental e da economia, isto é, o bem-estar individual das pessoas singulares parece estar em melhor forma do que o das pessoas coletivas.
Os últimos dados relatam a necessidade de mais crédito para apoio à atividade das empresas, bem acima dos seis mil milhões de euros anunciados pelo Governo, elevando a fasquia das necessidades globais.
Agora que o dinheiro começa a chegar às empresas, esperando que os apoios não sejam meros paliativos de tesouraria que podem resultar em insolvências, com as perdas em cascata e maior desemprego, outros dramas sociais e o impacto económico nas contas.
Temos de aproveitar a inovação que promovemos e apostar em novos mercados de proximidade geográfica para escoamento de produtos agrícolas, buscar e fomentar novos investimentos, públicos e privados, que têm de ser concretizados e viabilizados em nome do interesse geral. Esta será a melhor matriz para um Plano Marshall português, construído com a Europa sem ter de esperar pela Europa.