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Saúde: Novo sistema de avaliação testado em Portugal

Hospitais poderão passar a ser financiados em função dos resultados percecionados pelos utentes e não e pelo volume de atos realizados.
18 Fevereiro 2017, 13h00

Portugal vai ser o palco de uma experiência-piloto de avaliação dos cuidados de saúde, que promete revolucionar o modelo atualmente em vigor em todo o Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Trata-se do modelo de avaliação proposto pelo International Consortium for Health Outcomes Measurement (ICHOM), organização que resulta de um consórcio entre a Harvard Medical School (HMS), o Karolinska Institutet (Kit) e o The Boston Consulting Group (BCG), a partir de um modelo desenvolvido pelos investigadores Michael Porter e Elizabeth Teisberg, ambos da Universidade de Harvard.

O modelo deverá ser implementado pela primeira vez em Portugal no Centro Hospitalar de Lisboa Central, que integra os hospitais de S. José, Curry Cabral, D. Estefânia, Santa Marta e Santo António dos Capuchos.

Tem como objetivo substituir a atual metodologia de avaliação assente em métricas de volume – quantas consultas, quantas cirurgias, quantos internamentos, quantas horas – por uma avaliação que tem como indicador os resultados percecionados pelos utentes.

“As métricas do ICHOM focam-se em quão melhor ficou o doente por consequência de um ato médico; focam-se na qualidade de vida do doente depois do ato médico e não no ato em si”, explicou ao Jornal Económico João Marques Gomes, CEO da Nova Healthcare Initiative, parceiro português do ICHOM.

Segundo o investigador, “a ideia, em si, não é nova. As empresas, em geral, têm a preocupação de acrescentar valor aos seus clientes. Trabalham para satisfazer o cliente. A novidade é que poderá agora ser transposta para um setor – saúde – onde a ênfase é hoje colocada, não na satisfação do doente, mas nas métricas de volume”.

Ou seja, num universo em que o doente está no centro da decisão, é necessária uma nova forma de avaliação. E o que interessa ao doente? – questiona-se, respondendo: “[O que interessa ao doente] é estar tão bem quanto possível, isto é, ter tanta qualidade de vida quanto possível depois do ato médico. Este é o aspeto que mais interessa ao doente e é para isto que todo o sistema, de uma forma global, deveria estar a trabalhar”, defende Marques Gomes.

Para as Ciências Económicas, as métricas são instrumentos de uso diário, porque, a partir destas, é possível conhecer o número de consultas efetuadas, de doentes internados e o número de dias utilizado para o efeito, entre outras informações. Contudo, e enquanto outputs intermédios, não precisam a melhoria de vida do doente, que importa medir.

“Qual é, afinal, o acréscimo que as intervenções clínicas produzem na vida do doente?”, questiona o investigador, que avança com um exemplo prático do funcionamento do novo modelo de avaliação proposto: “Imagine-se que o hospital A produz três vezes mais consultas e cirurgias cardiovasculares do que o hospital B; imagine-se, depois, que 75% dos doentes tratados no hospital A acabam por ter novos eventos cardiovasculares no futuro (AVC, enfartes do miocárdio ou, mesmo, a morte). Por hipótese, o mesmo não acontece com os doentes do hospital B ou a percentagem dos casos é muito baixa, quando comparado com o A. Nestas circunstâncias, qual é então o hospital mais produtivo? Nos termos em que o nosso sistema de saúde está organizado, dizemos que o hospital A é o hospital mais produtivo, porque é aquele que produz mais consultas, mais atos. No entanto, se medíssemos a atividade clínica com base no valor que os atos médicos produzem efetivamente, diríamos que o hospital B é o hospital mais produtivo”.

Estudo começa com hipertensão
Em Portugal, vão ser padronizados resultados para a hipertensão arterial. A primeira tarefa será compilar todos os dados de todos os doentes com esta patologia seguidos nas unidades hospitalares, com o objetivo de medir os resultados dos pacientes de uma forma padronizada, ou seja, verificando o que de mais relevante na perspetiva da maioria dos utentes resultou dos cuidados prestados.

“Por exemplo, se a medicação prescrita pelos médicos não teve como efeito secundário dificuldade em urinar, ou a frequência das consultas de acompanhamento não impactar negativamente o dia-a-dia do doente”, exemplifica Marques Gomes, acrescentando: “As métricas do ICHOM têm a vantagem de resultarem de equipas internacionais e de serem aplicadas em vários países do mundo. Se Portugal também adotar estas métricas, a qualidade dos cuidados de saúde portugueses poderá ser diretamente comparada com a qualidade dos cuidados de saúde prestados nos Estados Unidos da América, na Alemanha, em Inglaterra, na Suécia, no Dubai ou na Austrália”.

O ICHOM realizou este mês a sua primeira conferência em Portugal, uma iniciativa conjunta da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), da Nova Medical School e do Centro Hospitalar de Lisboa Central, que juntou na capital os principais stakholders do setor da saúde e que contou com a presença do ministro da tutela, Adalberto Campos Fernandes, que na sua intervenção manifestou interesse neste modelo.

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