Os censos de 2021 demonstram as dificuldades sentidas pela população com incapacidade em quatro domínios de funcionalidade essenciais, definidos pelo modelo Grupo de Washington para Estatísticas sobre Pessoas com Deficiência: visão, audição, mobilidade e cognição/memória. Os números revelam que 10,9% da população residente em Portugal, com cinco ou mais anos, tem pelo menos uma incapacidade, situação esta que aumenta com o avanço da idade, de forma progressiva, sobretudo a partir dos 70 anos, e que afeta mais as mulheres.
Este cenário exige uma reflexão sobre o elevado risco de exclusão e pobreza de parte da população nacional e as medidas que têm sido, e devem ser, tomadas para o mitigar.
Em 2009, Portugal adotou a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CNUDPD), na qual reconhece o papel das “pessoas com deficiência para o bem-estar geral e diversidade das suas comunidades”, através da promoção dos seus direitos e liberdades fundamentais, que resultam “num sentido de pertença reforçado e em vantagens significativas no desenvolvimento humano, social e económico da sociedade e na erradicação da pobreza” e associada marginalização.
Prioridade, também, assumida pelo documento estratégico sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência para 2021‑2023 – União da Igualdade, onde a acessibilidade aos ambientes construídos se assume como um elemento facilitador dos direitos, da autonomia e da igualdade. Para a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, todos têm direito “a viver de forma independente, a oportunidades iguais e a participar plenamente na vida da sua comunidade”.
Neste alinhamento, são exigidas ações concretas nas cidades, como indica o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis, ao realçar a importância do acesso universal nas áreas urbanas, à habitação e transportes, através da eliminação de barreiras à mobilidade, a espaços públicos seguros e a programas de inclusão social, económica, cultural e ambiental.
Esta consciencialização tem introduzido os princípios do Design Universal ou Desenho para Todos nas boas práticas de criação de políticas públicas para um relacionamento com ambiente construído inclusivo. Para o arquiteto Neil Murphy, do Centre for Excellence in Universal Design, promotor do “Building for Everyone: A Universal Design Approach”, é fundamental que a conceção de ambientes seja pensada para que possam ser acedidos, compreendidos e utilizados independentemente da idade, tamanho e capacidade.
O Desenho para Todos é, assim, o instrumento privilegiado para a concretização da acessibilidade universal e de uma cidadania inclusiva multidimensional, através da implantação de políticas e práticas urbanas que minimizem as desigualdades sociais e promovam a igualdade de oportunidades.
A arquiteta Lia Ferreira, Coordenadora da Estrutura de Missão para a Promoção das Acessibilidades (EMPA), descreve que no quadro do desenvolvimento sustentável e da criação de territórios mais resilientes e inclusivos, “é preciso assumir a responsabilidade de criar sinergias musculadas, no âmbito da melhoria das condições de acessibilidades”. Estas são o pilar “estruturante e determinante para o pleno exercício de direitos fundamentais, qualidade de vida e contributo incontornável para a coesão, eficiência e competitividade dos territórios”.
Apesar dos progressos, ainda há muitos obstáculos à acessibilidade universal e ao direito a territórios inclusivos. Os desafios vão no sentido de operacionalizar o cumprimento das normas técnicas de acessibilidades, prestar apoio técnico, mobilizar os diferentes intervenientes (comunidade, instituições e empresas) e potenciar a eficácia e eficiência nos investimentos e medidas a implementar.