Vivemos num Estado de Direito Democrático apesar de às vezes não parecer. Veja-se o caso do IVA. Fará sentido os serviços públicos da justiça serem taxados a 23%, com a mesma taxa que se aplica aos bens ou aos serviços de consumo considerados não essenciais?

Vamos continuar a ter de pagar uma taxa de luxo para conseguirmos tratar do básico como a compra e venda de uma casa? É compreensível e justificável pagar 6% de IVA para comprar uma revista, assistir a um concerto ou dormir num hotel e 23% para fazer um testamento ou uma habilitação de herdeiros?

Taxar a 23% os serviços públicos essenciais prestados pelos notários é o mesmo que vedar o acesso dos cidadãos mais frágeis e mais vulneráveis à justiça, numa clara violação da Constituição. Com uma taxa de IVA equiparada à dos produtos e serviços de luxo, cai em saco roto o princípio de que todos os cidadãos são iguais perante a lei e de que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Não pode acontecer, não podemos permitir que a Justiça seja negada a quem não tem dinheiro para a pagar.

Claro que o Orçamento do Estado configura um conjunto de opções sobre receita e despesa que visa apresentar as melhores soluções para o País. Claro que, na maior parte das vezes, as contingências do momento pesam muito mais nas escolhas que as medidas para o médio e longo prazo. Tudo isto é compreensível, mas vamos continuar a cometer os mesmos erros?

A Justiça não pode continuar a ser o parente pobre nas prioridades do Estado, sobretudo num OE que até tem alguns exemplos de medidas que vêm reduzir a carga fiscal dos portugueses.

Se queremos uma sociedade mais séria, mais justa e mais inclusiva, se queremos viver num Estado de Direito que verdadeiramente cumpra o texto Constitucional, o Parlamento tem de ter a coragem de corrigir este erro grave e terrível – relegar para segundo, terceiro ou vigésimo plano o acesso ao Direito e à Justiça é uma opção política ou uma violação clara da Constituição?

Como um dia disse – e bem – o senhor primeiro-ministro: “A igualdade deve ser uma causa de todos os dias”. Pois também na Justiça devemos aplicar esta máxima através da fixação de uma taxa de IVA reduzido que nos permita a todos caminhar para um futuro onde sejamos mais iguais. A bem de todos. A bem do país.