O mecanismo de controlo mais usualmente utilizado pelos gestores para influenciar o comportamento dos colaboradores, no sentido de lhes dar direção (“what you measure is what you get”) e motivar, assenta num conjunto de premissas bastante simples: definimos as dimensões de desempenho (objetivos), para os quais escolhemos indicadores de mensuração (os famosos KPIs que hoje dominam as conversas de corredor em qualquer empresa), e definimos as metas a atingir num determinado horizonte temporal, às quais associamos recompensas (ou penalizações) de cumprimento.
Claro que, considerando as idiossincrasias de cada colaborador, bem como as suas interações sociais em contextos grupais, a aplicação prática destes mecanismos de alinhamento organizacional – conhecidos na literatura de gestão sob a designação de “controlos cibernéticos por resultados” ou “gestão por objetivos” – origina frequentemente enviesamentos comportamentais contraproducentes.
Cada pessoa segue fatores motivacionais próprios e dinâmicos ao longo do tempo, sendo que nem todos se motivam da mesma forma com a possibilidade de recompensas monetárias ou com perspetivas de progressão na carreira. Para alguns, ter poder dentro da organização controlando recursos, conseguir vencer desafios auto-impostos, fazer melhor que os rivais internos, ter reconhecimento dos líderes, participar em reuniões ou até almoçar com o patrão e ter o melhor lugar de estacionamento são fatores motivacionais tão ou mais eficazes que o bónus salarial anual.
Contudo, os problemas que me parecem de mais difícil resolução resultam dos processos de definição das metas de desempenho. Como estudado pela Psicologia, assume-se que, em condições normais, a motivação aumenta com o nível de dificuldade da meta, mas até ao limite da perceção de exequibilidade por parte do colaborador.
Também neste âmbito são bem conhecidos os efeitos comportamentais decorrentes da criação de “almofadas de segurança” na negociação de metas ou inversamente do seu enviesamento otimista, da manipulação de informação, dos conflitos de tomada de decisão originados pelo confronto entre a ambição motivacional necessariamente otimista e o conservadorismo subjacente à alocação de recursos, da focalização excessiva no cumprimento da meta e da desculpabilização do subdesempenho por via do pretenso impacto negativo de fatores da envolvente.
É, neste âmbito, que surge aquilo que eu denomino de “armadilha do incrementalismo”, muito própria das lógicas de melhoria contínua: acreditar que o desempenho passado é o elemento mais relevante no processo de definição das metas futuras, cristalizando-se assim referenciais subótimos, mas que projetam sempre tendências positivas face ao período anterior.
Alguns exemplos ilustram esta “armadilha”: se nos últimos dois anos conseguimos reduzir uma taxa de desperdícios de 13,5% para 12,5%, não será razoável negociar uma meta para o período subsequente de 12%? Mas porque consideramos “normal” ter desperdícios de 12% (“toda a gente sabe que nesta indústria é esta a taxa de desperdício”)?
Porque não 3% ou 0%? Porque devemos ficar satisfeitos se um dado rácio de rentabilidade financeira evolui positivamente ao longo do tempo e ainda assim somos a pior empresa do sector? Aceitamos a negociação duma meta de 10% de variação das vendas quando se perspetiva um crescimento de mercado de 25% (o raciocínio inverso também se aplica)? De que vale o FC Porto fazer mais pontos que na época anterior se o Benfica for campeão?
Uma das formas de contrariar este efeito é o recurso ao benchmark interno e externo como mecanismo de aferição da razoabilidade da meta face às melhores práticas, introduzindo, sempre que possível, lógicas de metas relativas e não absolutas (exemplo: definir metas de quota de mercado e não vendas; ter um retorno financeiro 5 p.p. acima da concorrência). Mais arriscado é ousar ser disruptivo nas metas de desempenho, quebrando com as lógicas incrementalistas, sendo neste contexto muitas vezes vantajosa a lógica da imposição de metas face à usual alternativa de negociação.
Por experiência própria, acredito que, com liderança adequada, é possível fazer percecionar nos colaboradores como sendo exequíveis metas à partida consideradas inatingíveis, criando desta forma aspirações individuais e de grupo com elevado potencial motivacional. Estes processos de rutura de referenciais de desempenho são tipicamente mais fáceis de atingir em conjunturas organizacionais de mudança, por exemplo, com gestores recém-chegados, em momentos de alteração de rumo estratégico ou de introdução de novas tecnologias.
Contudo, “shooting for the moon” – numa referência ao artigo “Google’s Larry Page on Why Moon Shots Matter”, Wired Magazine, 2013 – tem também riscos significativos de credibilidade da gestão: é comum encontrarmos gestores que estabelecem levianamente metas do tipo “duplicar a dimensão do negócio nos próximos cinco anos” e são posteriormente confrontados com as utopias que eles próprios criaram.