O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) defende que o sistema de justiça português “está equilibrado e funcional”, criticando aquilo que designa como a retórica de que existe crise na Justiça o que, diz António Joaquim Piçarra, é contrariado com o aumento da confiança dos cidadãos nas instituições do sector e com dados relativos à redução dos processos pendentes de decisão judicial”.
“Proponho colocar o problema da crise da justiça noutra perspectiva, desafiando a saber se existe uma verdadeira crise da Justiça. É uma retórica replicada de forma acrítica e, por vezes, até perversa”, afirmou a António Joaquim Piçarra na sessão solene de abertura do ano judicial, este ano no Palácio da Ajuda, em Lisboa, devido ao STJ encontrar-se em obras.
O líder do STJ questiona: “problemas sérios, sim. Mas serão suficientes para continuar a afirmar a existência de uma crise?”. António Joaquim Piçarra avança com dados de um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos sobre a percepção pública dos indicadores da justiça para concluir que “a percepção que os cidadãos têm está alinhada com a ideia de equilíbrio funcional”.
“A confiança nas instituições da justiça tem aumentado, situam-se agora nos 41%. Este dado, sobre o reconhecimento público, , legitima que pode pedir-se a políticos e comentadores que questionem a sua retórica quando falam em crise da justiça”.
Para o presidente do STJ “mais importante que a percepção pública , está a atividade processual e capacidade de resposta do sistema da justiça”. A este respeito, António Joaquim Piçarra faz o balanço de 2019 para concluir que que foram decididos mais processos do que os entrados na esmagadora maioria dos meses do ano passando, tendo-se assistido a uma redução dos processos pendentes.
“Terminámos o ano com cerca de 310 mil processos pendentes de decisão judicial, assistindo a uma redução de 60 mil processos num ano”, avança, concluindo que “globalmente temos um sistema de justiça operativo e funcional”.
No seu discurso, o presidente do STJ alertou ainda que “a justiça não é dos juízes e dos procuradores, é do povo português”, realçando que “a justiça é uma instituição solene, uma instituição nossa e dos portugueses” e que as “as forças e fraquezas da justiça são virtudes e defeitos da democracia portuguesa”.
O evento, que conta com intervenções da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem; da procuradora-geral da República (PGR), Lucília Gago; do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), António Joaquim Piçarra e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ocorre numa altura em que importantes investigações – caso BES/GES, operação Lex, caso TAP, processo EDP que envolve o ex-ministro Manuel Pinho e o presidente da EDP, António Mexia – ainda não saíram da fase de inquérito, e em que processos como o do BPN se prolongam e arrastam em recursos sem trânsito em julgado à vista.
A cerimónia, sobretudo de caráter simbólico e que este ano coincide com o fim das férias de Natal dos magistrados, assinala também o arranque de um ano em que é aguardado o fim da instrução do processo Operação Marquês, que determinará se o antigo primeiro-ministro José Sócrates, o seu amigo e empresário Carlos Santos Silva e o ex-presidente do BES Ricardo Salgado, entre outros arguidos, vão ou não a julgamento.
A falta de funcionários judiciais nos tribunais, o atraso na aprovação dos seus Estatutos, o défice de inspetores na PJ a falta de peritos na investigação criminal e no combate ao cibercrime, bem como o descontentamento sindical nos Registos e Notariado são alguns dos temas que preocupam o sector .
Em termos de política de justiça, um dos temas que parece incontornável na abertura do ano judicial é a iniciativa do Governo de criar um grupo de trabalho, liderado pela ministra da Justiça, para definir, no prazo de três meses, uma estratégia plurianual de combate à corrupção.
Prevê-se, entre outras medidas, a implementação e aperfeiçoamento do instituto da delação/colaboração premiada, que incentive e proteja quem colabore com a justiça na descoberta dos crimes, sobretudo de natureza económico-financeira, mas o tema revela-se polémico, tendo ficado fora das medidas aprovadas no último Pacto para a Justiça. Um pacto esse que acabou por ficar em larga medida “na gaveta”, designadamente as medidas anticorrupção aí previstas.
Vários partidos com assento parlamentar colocaram já reservas à figura da delação premiada, incluindo o Partido Socialista, que avançou com a medida para assinalar o Dia Internacional Contra a Corrupção.
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