Neste último domingo, realizou-se a primeira ronda das eleições presidenciais francesas. Desta vez, não houve surpresas, tendo os resultados finais ficado alinhados com as sondagens realizadas anteriormente.

Mas, na minha opinião, o mais importante na análise dos resultados de domingo passado é a sua similaridade com os resultados do referendo britânico para sair da União Europeia e das eleições presidenciais nos Estados Unidos da América, realizados em 2016.

Apesar de, nas eleições francesas, não ter vencido – pelo menos para já e não se espera que o faça a 7 de maio na segunda ronda – o candidato com um discurso de protesto, mais radical e agressivo, que deseja implementar medidas de ruptura total com a realidade actual e que vão ao encontro da insatisfação e frustação de uma parte importante da população que vota, verificou-se que a sociologia do eleitorado francês, britânico e americano é, no meu entender, similar, e que, portanto, estamos perante um fenómeno social global dos países ocidentais desenvolvidos.

Nas três eleições verificou-se que a maioria do eleitorado que vive nos principais centros urbanos, com nível de educação e com rendimentos mais elevados votou, claramente, para a continuação das políticas actuais de integração e globalização. Pelo contrário, a grande maioria do eleitorado que vive nos centros mais rurais, com nível de educação e rendimentos mais baixos, votou, massivamente, para uma alteração radical das políticas atuais, preferindo os candidatos que querem implementar medidas protecionistas, que fechem as fronteiras para a livre circulação de pessoas, capital e comércio.

Veja-se, por exemplo, que Marine Le Pen foi apenas quarta na Grande Paris, com 14% dos votos, e que se estima que tenha obtido menos de 15% dos votos dos eleitores com educação acima da licenciatura e, também, dos eleitores com rendimentos mensais superiores a 3.000 euros. No Reino Unido, aconteceu o mesmo no referendo, onde nas 30 maiores cidades o Remain ganhou com 55% dos votos, sendo de destacar que na Grande Londres ganhou com 60% dos votos. Nos EUA, nos principais estados urbanos de Nova Iorque ou Califórnia Hillary Clinton venceu com 60% dos votos.

Observamos, pois, nos países ocidentais desenvolvidos, uma clara divisão na sociedade, talvez nunca, pelo menos nas décadas mais recentes, tão acentuada como hoje.

De um lado, estão os indivíduos integrados no processo da globalização e menos presos a valores tradicionais e que tiraram proveitos disso, que se movem globalmente, vivem nas grandes cidades, têm um nível de educação superior, têm ligações profissionais a empresas multinacionais e rendimentos mais elevados. Este grupo quer que se acentue o processo atual de globalização e por isso vota em políticos do establishment.

De outro lado, estão os indivíduos não integrados no processo atual de globalização e que tiraram nenhum benefício do mesmo, tendo mesmo sido prejudicados. Esses indivíduos vivem, normalmente, em pequenas comunidades, sem ligações profissionais às empresas multinacionais, com rendimentos inferiores, regem a sua vida por valores mais tradicionais e procuram um futuro mais previsivel e protegido. Este grupo quer voltar às políticas protecionistas do passado, estando desíludidos com os resultados das políticas implementadas nos últimos 40 anos.

Espera-se, agora, que os decisores políticos entendam as causas reais do que se está a passar e dos últimos resultados eleitorais e implementem políticas que vão ao encontro do interesse e das expetativas de todos, não deixando de fora nenhum grupo, que neste caso representa quase metade da população, por forma a evitar que se destrua, num futuro próximo, tudo o que foi construído nas últimas decadas.