As últimas semanas têm sido dominadas pelos ecos na comunicação social das medidas do governo na área da habitação. Argumentos a favor e argumentos contra estas medidas, ainda sob consulta pública, não têm faltado.
No entanto, independentemente do beliscão à propriedade privada, dos constrangimentos à atividade de alojamento local (que permitiu criar uma fonte de rendimento para pequenos proprietários, legalizar arrendamentos que se encontravam, em grande parte, no mercado paralelo, recuperar zonas degradadas nos centros das cidades, criar emprego e desenvolver o turismo), da disponibilização de habitação pública ou da assimetria fiscal que se vai provocar com o pacote fiscal anunciado, que penaliza o alojamento local, beneficia a conversão deste para arrendamento urbano e que cria iniquidade com arrendamentos já existentes, há uma questão que surge bem em cima da mesa.
Como operacionalizar esta política de habitação, com uma máquina do Estado tão pesada e burocrática e que, em muitas circunstâncias, tem mostrado pouca agilidade para colocar em prática políticas públicas diversas?
Por outro lado, uma política de habitação, que reduza a escassez da oferta e controle os preços é uma política de longo prazo. Não se constroem casas novas de um dia para o outro, nem se reabilitam a um ritmo tão mais elevado que o da construção nova, por isso, algumas destas medidas terão um alcance insuficiente para a urgência de curto prazo em que vivemos.
Pretende-se resolver no curto prazo um problema que tem um carácter de longo prazo. O desequilíbrio entre a oferta e a procura e alguma especulação imobiliária têm feito subir os preços da habitação, o que dificilmente será resolvido com as medidas agora anunciadas. Devia e podia ter-se começado mais cedo.
Estas dificuldades tornam o tema da habitação ainda mais preocupante: (i) para os jovens que não conseguem autonomizar a sua vida e sair de casa dos pais, dadas as baixas remunerações que auferem e as elevadas rendas praticadas, já não só no centro das cidades, mas também em locais mais periféricos; (ii) para a elevada percentagem de famílias que vive com o ordenado mínimo nacional e não consegue suportar os preços do mercado imobiliário; (iii) e, para as famílias com crédito à habitação ou com intenção de se financiarem para aquisição de casa própria, que se debatem com a tendência crescente das taxas de juro, o que constitui um fator adicional de dificuldade.
Em suma, o problema da habitação é apenas a ponta de um icebergue, que radica no problema de os portugueses terem rendimentos muito baixos. Somos um país de pobres e isso é um verdadeiro constrangimento, que se propaga a várias dimensões da vida dos indivíduos, de que a habitação é apenas um exemplo.
Decorreram cerca de 37 anos desde a adesão de Portugal à CEE, atual União Europeia, e o país progrediu em muitas áreas, mas não deixou de ter um PIB per capita que se mantém dos mais baixos da Europa, permanecendo, ainda, no grupo dos países da coesão. Os dados do Eurostat são claros e permitem constatar que o PIB per capita em paridade de poder de compra desceu de 85% em 2000, para 74% em 2021, em relação à média comunitária.
O problema não é fácil para este ou qualquer outro governo. Medidas de curto prazo, também são necessárias e podem mitigar alguns dos constrangimentos atuais, mas políticas estruturais de incremento ao nosso desenvolvimento e de geração de riqueza são verdadeiramente o que o país necessita e, essas, temos muita dificuldade em as implementar.