Numa recente decisão do Tribunal Arbitral (processo n.º 684/2020-T) foi adotado um entendimento inovador – tanto quanto sabemos – no que diz respeito a rendimentos de nacionais americanos que beneficiem do regime do residente não habitual (“RNH”), que, a consolidar-se no ordenamento jurídico português, poderá representar para estes uma vantagem considerável.
Subjacente à decisão do CAAD está o seguinte quadro factual: o Requerente, de nacionalidade americana, residente em Portugal (“PT”) e beneficiário do regime do RNH obteve rendimentos de fonte americana (“rendimento EUA”) e de fonte francesa (“rendimento FR”) derivados da alienação de bens mobiliários, os quais foram efetivamente tributados nos EUA.
A Autoridade Tributária (AT) considerou que estes deveriam ser sujeitos a tributação em Portugal, não estando reunidas as condições para beneficiar da isenção que o regime do RNH prevê. O Tribunal, porém, propugnou uma posição distinta, concedendo uma isenção relativamente aos rendimentos de ambas as fontes.
A posição da AT teve por base o facto de, de acordo com as Convenções de Dupla Tributação (“CDT”) estabelecidas quer entre Portugal e os EUA quer entre Portugal e França, a competência para tributar as mais-valias mobiliárias estar alocada exclusivamente a Portugal. Ora, de acordo com o regime do RNH, para que os rendimentos sejam isentos em Portugal, exige-se que sejam “tributáveis” no outro Estado Contratante, à luz da CDT respetiva.
A decisão do Tribunal Arbitral teve por base as seguintes considerações:
Relativamente ao rendimento EUA, o Tribunal notou a existência de uma “saving clause” no Protocolo estabelecido entre Portugal e os EUA, que é parte integrante da CDT celebrada entre os dois Estados, segundo a qual os EUA podem tributar os seus cidadãos como se a CDT não tivesse entrado em vigor. Considerando que o sistema fiscal dos EUA permite a tributação baseada na nacionalidade (cidadania), o Tribunal considerou que os rendimentos obtidos nos EUA são “tributáveis” nesse Estado, estando, assim, isentos em PT.
A este respeito, parece ter relevado o facto de os rendimentos terem sido efetivamente tributados nos EUA, pese embora essa não seja uma condição exigida pelo regime do RNH, pelo que não deverá, em princípio, influir no direito à isenção.
A posição do Tribunal sobre os rendimentos FR é, contudo, menos direta. Alicerçando-se no Protocolo suprarreferido que, na opinião do Tribunal, gera uma “situação tripartida”, este considerou que os EUA também devem ser vistos como um “Estado contratante” para efeitos do regime do RNH, onde os rendimentos são tributáveis, estando cumpridos os pressupostos para a aplicação da isenção.
Novamente, o facto de os rendimentos provenientes da França terem sido efetivamente tributados parece ter pesado (mais ainda) na decisão do Tribunal, que refere não haver justificação para aplicar o método da isenção a situações apenas suscetíveis de tributação no estrangeiro, e não o aplicar quando essa tributação efetivamente ocorreu.
Seria interessante saber se a decisão do Tribunal teria sido diferente se o rendimento não tivesse sido efetivamente tributado, e de que forma estas considerações serão (ou não) acolhidas em processos futuros.