É verdade que a ascensão de um Governo populista ao poder em Itália incrementa significativamente aos factores de risco da dívida soberana do país, mas será isso justificação suficiente para um aumento assustador da volatilidade e para uma subida das taxas de juro a curto prazo sem precedentes?

Para além do montante de dívida italiana, uma fotografia fundamental da situação actual de Itália para o curto prazo não levanta grandes alertas. A maturidade média da dívida do Estado é de mais de 7 anos; o custo médio desta dívida tem margem para continuar a cair, mesmo depois da recente subida das taxas de juro (!); o sector financeiro tem vindo a trabalhar relativamente bem na sua recapitalização; a balança comercial tem melhorado significativamente. Entre outros factores que tornam pouco provável que a subida das taxas de juro tenha um efeito de contágio sistémico… O receio reside por isso no rumo que o novo Governo possa tomar a médio prazo, mas também em relação a isso a reacção do mercado pareceu exagerada. As promessas de indisciplina orçamental e a perspectiva de divergência da Europa são preocupantes, no entanto existem vários constrangimentos constitucionais a algumas das principais linhas de acção da coligação, o que significa que a materialização de tais receios não é de todo certa.

Neste caso não parecem ter sido, somente, os factores fundamentais do caso italiano que provocaram o stress no mercado de dívida soberana. Para os que acompanharam a dívida soberana de perto nesses dias, a falta de liquidez e profundidade no mercado foi o algo que saltou à vista. É normal que a liquidez seja mais reduzida em dias de stress, principalmente num dos lados do mercado (comprador ou vendedor), mas nos dias em que as taxas de juro da dívida italiana mais subiram existiam estranhamente poucos dealers a “fazer” o mercado e ainda menos liquidez do que seria de esperar. O que muito provavelmente exacerbou a subida das taxas de juro, e consequentemente o stress.

Esta falta de liquidez e de profundidade do mercado é, na minha opinião, causada em grande medida pelo excesso de regulação a que o sector financeiro tem vindo a ser sujeito ao longo dos últimos anos. Com os vários constrangimentos à actividade, com as complexas exigências de capital – que encostam as instituições financeiras aos activos soberanos de maneira a acederem aos requisitos de capital – e com as imposições de controlos de risco, os reguladores estão a distorcer o mercado de tal forma que estão, eles sim, a criar uma nova fonte de risco sistémico.

As intenções do regulador são obviamente boas, mas as medidas que foram implementadas parecem ter afastado do mercado os players que tendiam, noutros tempos, a absorver/negociar os activos sob stress. Fosse porque conseguiam ver para além dos receios de curto prazo, ou porque tinham mais margem para assumir o risco. O afastamento destes players é sem dúvida um prejuízo para o mercado, que terá que se habituar a ocasionais picos extremos de volatilidade, e às consequências que isso possa trazer. No caso de Itália, as consequências da volatilidade podem até ser benignas, na medida em que servem como dissuasor de políticas demasiado radicais. Noutros casos, a história pode ser diferente…