Rezamos para que as vacinas contra o Coronavírus sejam eficazes, esta crise fique para trás e tudo volte ao normal – o regresso ao baú, business as usual. Mas um novo normal, descrito por SNAFU, acrónimo militar da segunda Guerra Mundial: “situation normal, all fouled up”.
O teletrabalho veio para ficar: trabalhar parte dos dias a partir de casa e só há um dia de jamboree por semana, agora que já é hábito ser controlado pelo produto, não pela presença. Nas escolas vigora o Zoom School Gang, nunca estivemos tão perto dos nossos filhos e com as portas dos quartos deles tão fechadas. Nos mercados, o tecnológico reina.
Os FAANG (Facebook, Apple, Amazon, Netflix e Google), que representam mais de 15% do S&P500 e em 2018 geraram 40% dos ganhos desse índice, as cotações em 2020 bateram novos recordes. A indústria dos jogos online cresceu como nunca: o market value da Roblox aumentou de 4 para 30 mil milhões de dólares num ano, o número de utilizadores diários de 82% para 31 milhões; a Take-Two Interactive Software subiu mais de 60% num ano; Activision Blizzard e Electronic Arts valem agora 29 e 23 vezes o cash flow.
Mas se algo vai marcar o novo normal no plano económico, é a dívida pública, agora que até nos EUA (eterno AAA) a dívida ultrapassou os 100% do PIB. Não há surpresa: em 2020 foram injetados na economia três milhões de milhões de dólares, 14% do PIB, sem contar os 935 mil milhões de despesa aprovada por Trump em dezembro e os 1,9 milhões de milhões prometidos por Biden. Na audição no Senado, Yellen disse: “the smartest thing we can do is act big.” É isto.
Alguns senadores republicanos e poucos democratas estão apreensivos com a dimensão do pacote e o seu targeting, sobretudo num cenário de recuperação rápida. O risco de sobreaquecimento e inflação existe e até Larry Summers, adepto aceso dos estímulos, está preocupado. A 0% de taxa de juro, os encargos da dívida são nulos, mas a 5% são 5% do PIB a pagar todos os anos.
É expectável que a política monetária se oriente para taxas de juro baixas mesmo com alguma inflação, agradável a um governo com um encargo nominal. Powell, Presidente da Fed, já disse que a taxa de juro “não vai subir nos próximos tempos”. Mas este é um problema a ser tratado quando a altura chegar, e ter-se-á de ser criativo – citando Fillon em 2017, “mas o que querem que eu faça da dívida?”.
Em França, uma proposta é isolar a dívida covid e criar um instrumento para a pagar – como Poincaré fez em 1926, Chirac em 1986. Gruson propõe emitir dívida a 10 anos à taxa 0, como dia 7 deste mês (a procura duplicou a oferta). Soros quer o financiamento por obrigações perpétuas, que defende melhor a solidariedade europeia. Mas a Alemanha já tem um plano a vinte anos para reembolsar a dívida covid, e a sua dívida pouco ultrapassa os 60% do PIB – não é um problema. Quando a Alemanha falar, outro acrónimo: SUAL, Shut Up And Listen.