Há poucos anos atrás, numa visita sindical a locais de trabalho, deparei-me com uma entidade financeira em que mais de um terço dos trabalhadores eram subcontratados. Lado a lado, trabalhadores com situações laborais muito distintas, numa escala que julgava que seria imprudente para qualquer gestor experiente. Sem surpresa, a dita entidade entrou, pouco tempo depois, em falência.
O racional subjacente à subcontratação de produção, operações e sistemas de informação, até parece ser sólido aos olhos dos accionistas e a intenção é óbvia: baixar os custos laborais e possibilitar ganhos adicionais de escala.
Mas a subcontratação massiva, o outsourcing, destrói o elevador social, degrada a classe média, aliena os trabalhadores e, no longo-prazo, diminui as margens das empresas. Amiúde, o resultado final é a falência.
Todos nos lembramos da famosa Kodak, fundada em 1888. Durante mais de um século a Kodak foi absolutamente dominante e inovadora nos mercados de fotografia. Porém, o digital, de que a empresa tinha sido a pioneira, levou-a à bancarrota em 2013. Uma década de subcontratação massiva de produção na Ásia e a empresa perdeu competências na produção, engenharia e desenvolvimento de produto.
Esqueceu-se que ter mantido a produção internalizada permitiria o desenvolvimento de ideias que levam ao desenvolvimento de novos produtos e serviços. Com a subcontratação massiva, a Kodak abriu as portas aos concorrentes que puderam contratar os mesmos fornecedores e usar a mesma tecnologia. Em breve as margens reduziram-se a tal ponto que a orgulhosa Kodak desapareceu.
O cenário tem vindo a repetir-se sector após sector. Como as empresas industriais ocidentais perceberam, tarde de mais, com a emergência dos novos concorrentes chineses, outrora seus subcontratados, em sectores como as telecomunicações, automóvel, meios de diagnóstico médico, entre tantos outros.
Aparentemente, imunes às lições da história, parece ter chegado o tempo de as empresas de serviços serem acometidas da mesma miopia estratégica. No sector financeiro, as posições administrativas (mas também técnicas e, em menor grau, de gestão) estão a desaparecer, sendo subcontratadas a terceiros fatias cada vez maiores de processos como a contratação e tramitação de crédito, o fornecimento e manuseamento de numerário, o desenvolvimento aplicacional, pagamentos e transferências, terminais de pagamento, habilitação de herdeiros, entre tantos processos que paulatinamente vão sendo transferidos para terceiros.
Percebemos a opção pela subcontratação em casos em que há manifestamente problemas de qualidade ou ausência de escala mínima. Mas em todas as outras situações, com a subcontratação minamos a lealdade dos trabalhadores e a sua motivação, ao defrontarem-se com o espectro da redundância ou com outros, ao seu lado, em modalidades que mais parecem saídas de um livro de Charles Dickens.
Em moldes massivos, a subcontratação é perniciosa para as hipóteses de longo-prazo das empresas e tóxica para os trabalhadores. Nenhum sindicato pode ficar indiferente ao seu recurso indiscriminado.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.