Num mundo em que os valores, ou a sua transgressão, têm efeitos financeiros adversos e relevantes, a ética – e, para o que aqui importa, o combate à corrupção – assume-se como uma obrigação de gestão, esperada da liderança das organizações mas, mais importante do que isso, uma exigência alicerçada em processos auditáveis e em códigos de conduta implementados como componente crítica dos processos de negócio.

Internacionalmente os casos têm-se sucedido e as consequências – desde logo as financeiras – incrementam. Que conclusões podemos retirar da realidade dos últimos anos?

  1. Não, não acontece só aos outros. Inicialmente entendida como matéria circunscrita a setores tradicionais e com exposição direta ao Estado, conhecem-se hoje penalizações severas aplicadas em setores tão variados como construção, banca, seguros, oil & gas ou a própria indústria farmacêutica.
  2. A verdade magoa. Os custos diretos decorrentes do enforcement de situações de suborno ou corrupção (potencial, comprovada ou confessada) passaram, em poucos anos e com a massificação da aplicabilidade extraterritorial destes regimes, de valores incipientes para centenas de milhões de euros. A estes valores, aplicados às empresas infratoras, acrescem os danos reputacionais às mesmas infligidos e, bem assim, os custos inerentes à implementação de programas abrangentes de gestão deste tipo de risco, seja como parte dos compromissos assumidos aquando do settlement do caso, seja como mecanismo de gestão do risco reputacional gerado pela infração.
  3. É comigo, eu resolvo. Os deveres de diligência inerentes à gestão de uma qualquer atividade comercial incluem o conhecimento dos riscos e o estabelecimento de controlos adequados à sua expressão na atividade corrente da empresa. A violação destes deveres por parte da respetiva gestão determina, frequentemente, mais do que a violação dos deveres fiduciários atribuídos a administradores, direção e demais colaboradores: fundamenta a aplicação de sanções penais, contraordenacionais e disciplinares às pessoas singulares que incumprem estes deveres.
  4. Abordagem baseada no risco. As empresas devem implementar processos de avaliação regular do risco de suborno e corrupção detalhados, mapeando os processos críticos e mais expostos e estabelecendo controlos efetivos e auditáveis sobre os mesmos. Será com base nesta avaliação que a empresa pode, eficazmente, estabelecer processos exequíveis de controlo e gestão deste risco e que a respetiva gestão pode, eficientemente, excluir ou mitigar a sua responsabilidade.
  5. Globalização da gestão do risco. Uma parte significativa dos ordenamentos jurídicos admitem circunstâncias em que o regime de responsabilização penal e contraordenacional é aplicável a atos cometidos (e entidades residentes ou sediadas) noutros países. As fronteiras já não são, por exemplo, impeditivas da aplicação do regime estabelecido pelo Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) ou pelo UK Bribery Act. Como na célebre série de televisão, a frase “This is a local shop, for local people” não releva na gestão do risco de suborno e da corrupção.
  6. Requisitos organizativos. Olhando sobretudo à prática judicial e administrativa norte-americana, uma parte significativa das sanções aplicadas a entidades não residentes nos Estados Unidos (designadamente da Securities Exchange Comission) decorre da violação de regras organizativas, da conformidade, rigor e completude dos processos de registo contabilístico. O processo não é um detalhe, uma burocracia, é uma obrigação e um importante instrumento de gestão de risco.
  7. Abordagem holística. A gestão deste risco pressupõe processos e controlos em matérias tão variadas como ofertas e entretenimento, gestão de fornecedores, contratação de colaboradores e, também, regras de negócio e gestão de relação com o Cliente.

Abordaremos em maior detalhe em próximas ocasiões cada uma destas vertentes, mas resulta desde já claro que o entendimento de que “a única coisa pior do que falarem mal de nós é não falarem de nós” é um aforismo ultrapassado. Também, que no que à gestão diz respeito este não é um tema menor, alheio aos deveres de um gestor diligente, porque também na gestão deste risco “a sorte não existe. Aquilo a que chamas sorte é atenção aos detalhes”.