O projeto de investigação MeDeMAP – Mapping Media for Future Democracies, A Challenge for the Vitality and Sustainability of European Democracies, de que faço parte integrado na equipa da Universidade Lusófona, é financiado por Horizon Europe, desenvolvido por um consórcio de instituições de 10 países da UE e é liderado pela Academia das Ciências da Áustria.

MeDeMAP tem como objetivo contribuir caminhos futuros para fortalecer a democracia através da melhoria da responsabilização, transparência e eficácia da produção de media e a expansão da cidadania ativa e inclusiva, tornando evidente o que está em jogo para os media democráticos – e para a própria democracia.

O design multimétodo de investigação inclui métodos de ciência de dados, análises quantitativas em grande escala, abordagens qualitativas aprofundadas e pesquisa-ação participativa.

O projeto cobre perspetivas de noções representativas e participativas de democracia tal como existem nas sociedades europeias, assim como toda a gama de meios de comunicação social, independentemente do canal de distribuição, mandato, propriedade e fonte de financiamento.

Aborda ainda o quadro legal e (auto)regulador sob o qual as empresas de media e o jornalismo operam e ainda o potencial dos media para promover e apoiar a participação política (lado da oferta). Finalmente, o projeto aborda os padrões de utilização dos media, as necessidades de comunicação e as atitudes democráticas dos públicos (lado da procura) nos países que estão representados no consórcio.

É um projeto muito interessante e que se espera venha a ser útil. Desde logo porque vai permitir confrontar legislação, dados sobre oferta e consumo de media naqueles países e que conta já com o contributo de especialistas e académicos em várias áreas, assim como do público consumidor através de inquéritos e focus groups.

Os media vivem hoje um período de transição complexo e desafiante. Segundo dados em circulação, mais de 80% da receita de publicidade em Portugal vai para os gigantes das redes sociais, como por exemplo LinkedIn, uma rede que alimentamos com os nossos CV e comentários, como é o caso deste artigo que começou como um post no LinkedIn. No momento em que escrevia estas linhas no LI, pensei que de facto estava a trabalhar para a dona do LI, a Microsoft. Os restos da receita da publicidade que não vão para os gigantes das redes são migalhas que ficam para os media portugueses, TV, rádios, imprensa, e para o nosso pequeno digital.

Por outro lado, ao escrever um post sei que estou em plena liberdade a chegar a uma pequena amostra de cidadãos portugueses (e outros tantos estrangeiros) exercendo o meu direito à liberdade de expressão e de opinião na democracia participativa. É a contrapartida oferecida por LI. Além disso, posso utilizar a rede para monetizar outros projetos, como por exemplo promover a subscrição de uma newsletter com publicidade paga pelos anunciantes.

Ou, como na maior parte dos casos, promover o meu brand profissional na procura de oportunidades de emprego, ou utilizar o meu brand profissional para promover a minha empresa, como é o caso de muitos CEO, por exemplo Michael Bloomberg.

O modelo de negócio dos media ditos tradicionais ou legacy foi destruído. Como se trata de um mercado onde a dimensão, o reach,targeting é tudo, o que vai acontecer será a consolidação dos media e os que ficarem continuarão a ser uns asteroides no cosmos digital, reduzindo a concorrência, o que tem implicações na qualidade da democracia.

Os que ficarem são os media de qualidade. Todavia, são os media jornalísticos os principais fornecedores de informação fidedigna que circula nas redes porque, de facto, os consumidores procuram qualidade, seriedade e idoneidade jornalística. Ora, no momento em que, há pouco tempo, a Disney decidiu colocar o seu canal de TV (ABC) à venda, porque a receita de publicidade é considerada insuficiente, embora ainda gigante, o futuro ficou explicado e traçado.

Depois do streaming puro (Netflix, HBO) apareceram outros com modelos de negócio diferentes (Amazon Prime) ou outros modelos de negócio streaming (Netflix com publicidade). Além disso, analistas consideram que parte do futuro da TV está no desporto em direto, o que diminui ainda mais o peso dos canais generalistas tradicionais. Na verdade, cada vez há mais desporto. Veja-se o Campeonato do Mundo de Futebol que em 2026 aumenta para 48 equipas e o que se lhe seguirá com mais de cem.

Outro sinal sobre para onde vai o futuro foi a recente contratação de Sir Mark Thompson para CEO de CNN (Warner.Discovery). Este antigo Diretor Geral da BBC foi o obreiro da fantástica transformação digital do “New York Times”.  Por ocasião da sua nomeação, Thompson disse que o mundo precisa de notícias precisas e confiáveis agora mais do que nunca e que nunca tivemos tantas maneiras de atender a essa necessidade no país e no exterior. “Onde outros veem disrupção, eu vejo oportunidade”, disse.

No “New York Times”, Thompson promoveu a subscrição digital como o principal meio de gerar receitas, ajudando a empresa a reduzir a sua forte dependência da publicidade impressa. No quarto trimestre de 2012, as subscrições apenas digitais do “Times” eram 640 mil. No segundo trimestre de 2020, aumentaram para 5,67 milhões. Durante sua gestão, o “Times” lançou novos produtos verticais, como por exemplo um dedicado à culinária. Adquiriu o site de recomendação de produtos Wirecutter e avançou de forma mais decisiva para projetos de TV, cooperando com FX, Amazon Prime Video e Netflix.

Thompson afirma que o segredo do sucesso está na qualidade jornalística. Mas, como pagar melhores salários à classe criativa nos media portugueses se a receita vai esmagadoramente para o digital dominado pelos gigantes Google e Meta? As redes sociais estão a ficar com o bolo quase todo da publicidade e sem publicidade não há jornalismo independente.

A concorrência é tremenda. As redes sociais ao permitirem que qualquer um exprima a sua opinião e divulgue factos (ou fake news) retirando aos media tradicionais a sua prerrogativa de gate keepers da opinião, estabeleceram um novo fórum de participação democrática. São um meio muito atrativo, surpreendente, malandro, ofensivo, sexy, colorido, infinitamente variado, híper acessível, etc.

Há uma alternativa ou complemento à publicidade que é a subscrição da versão digital de jornais. Mas para conseguir massa crítica é complexo, moroso, requer investimento em tecnologia, bom know-how e aprofundado conhecimento dos públicos.

A construção digital começa em uma marca que seja considerada de confiança e de qualidade. E esses dois atributos nunca se poderão perder e constroem-se com jornalistas, comentadores, analistas decentemente pagos e com enorme mestria na utilização das tecnologias digitais.

O problema é que os portugueses são dos europeus mais avessos a subscrever um jornal. De resto, sempre foram e a situação crítica de muitas famílias afasta-as de mais despesa.

Como tirar o máximo partido do jornalismo digital para garantir o futuro jornalismo independente, elemento essencial da democracia, e persuadir os portugueses a subscreverem a nossa imprensa é o grande desafio que enfrentam os media portugueses. O seu insucesso seria catastrófico para a democracia.

Na minha opinião, os media portugueses deveriam cooperar e em conjunto promoverem massivamente a subscrição dos seus títulos. E aqui fica uma ideia de slogan: subscrever um jornal é subscrever a democracia.