Promessas foram feitas, mas não foram cumpridas. É longo o calvário da TAP e dos mais de 3 mil milhões de euros injetados pelo Estado português. Vai haver retorno aos cofres públicos? A partir de quando podem os contribuintes contar com isso?
Em junho de 2022, o então chairman da TAP, Manuel Beja, foi ao Parlamento prometer que a companhia iria começar a pagar dividendos em 2025, altura em que estimava que os lucros já teriam regressado. O ano de 2025 foi mencionado porque era a data prevista para o regresso aos lucros (no plano entregue em Bruxelas em 2020),explicava então o gestor. Em meados de 2022, a companhia esperava ainda ter prejuízos esse ano. Mas surpresa das surpresas: a TAP registou lucros três anos mais cedo face ao previsto no plano: em 2022, 2023 e 2024, num total de 300 milhões de euros. Para este ano, tudo indica que vai voltar a fechar com resultado líquido positivo. E os dividendos? Chegou a altura de cumprir promessas feitas aos contribuintes?
“Conceptualmente, as empresas que são públicas e sendo rentáveis, devem remunerar o acionista”, defendeu ao JE, Miguel Frasquilho, antigo chairman da TAP entre julho de 2017 e 2021, data em que viria a ser substituído por Manuel Beja ainda a companhia não tinha regressado aos lucros nem concluído a reestruturação financeira que só ficou concluída este ano.
O ex-secretário de Estado do Tesouro e das Finanças no Governo de Durão Barroso recorda os lucros registados nos últimos anos pela companhia aérea nacional – que fechou o verão deste ano com lucros de 126 milhões.
Vamos aos números. A TAP está há três anos a dar lucro e prepara-se para fechar as contas no verde este ano. A companhia voltou aos resultados positivos em 2022 com lucros de 65,6 milhões de euros e receitas de 3,5 mil milhões, um novo recorde. Antes desta data, era preciso recuar a 2017 para encontrar um ano com contas positivas na transportadora (100,4 milhões), é claro que a pandemia pelo meio complicou a situação. Já em 2023, os lucros ascenderam a 177 milhões, o seu melhor ano de sempre, e em 2024 foram de 54 milhões.
O JE questionou tanto a TAP como a tutela, o ministério das Infraestruturas, sobre este tema, mas não obteve respostas.
Governo de Costa previu dividendos
Frasquilho salientano atual momento de privatização da empresa e que “o diabo está nos detalhes”. Explica aqui que desconhece se houve algum entendimento entre a gestão da TAP e o acionista Estado para o pagamento de dividendos em 2025 (ou atrasar o seu pagamento). Mas o JE sabe que no anterior Governo de António Costa, que teve Pedro Nuno Santos à frente do ministério as Infraestruturas de Fernando Medina com a pasta das Finanças, estava prevista a possibilidade de pagar dividendos ao Estado, uma vez finda a reestruturação financeira da TAP acordada com Bruxelas. Um processo concluído no início deste ano, com o Governo da AD a dar conta, em janeiro, da conclusão das operações para preparar a reprivatização da TAP: a aquisição pela TAP SA de 100% das participações da TAP SGPS, na Portugália, na UCS – Cuidados Integrados de Saúde e na Cateringpor,
E com a privatização em curso, o acionista Estado está disponível para aprovar dividendos?
“A cabeça dos políticos não está voltada para pagar dividendos, vão evitar qualquer coisa que ameaçe causar ruído” na privatização, aponta o especialista em aviação, Pedro Castro, acreditando que o Governo quer evitar ao máximo o tema da devolução dos 3,2 mil milhões de euros neste momento.
“A cabeça dos políticos está focada no sucesso da operação, em vender a TAP ao valor mais alto possível. Vão evitar correr o menor risco possível”, acrescenta.
No tiro de partida para a privatização este ano, o ministro das Infraestruturas Miguel Pinto Luz disse que a recuperação do dinheiro público seria feito “dentro do possível”, não prevendo um cenário de devolução total.
Devolver dinheiro em dividendos ou com abertura do capital?
Tanto o atual como o anterior governo defenderam a necessidade de reembolsar o Estado pelos apoios de 3.200 milhões de euros, que incluem verbas para fazer face aos efeitos da pandemia de covid-19.
Em dezembro de 2020, quando o então ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, marcava presença numa conferência de imprensa, garantia: “Em 2025, a TAP já estará em condições de devolver algum do dinheiro ao Estado português”. O então gabinete de Pedro Nuno Santos avançou, então, ao Polígrafo que “nessa altura [2025], a TAP pode devolver dinheiro em dividendos, se essa for a indicação do acionista. E também poderá devolver dinheiro no momento em que houver algum processo de abertura de capital a terceiros, ou seja, uma venda”.
Mas cerca de cinco anos depois, a principal e única forma de o Estado poder reaver o dinheiro que injetou na companhia aérea será através da venda da participação no capital, ou seja, da reprivatização da TAP. O atual ministro das Infraestruturas já afiançou que não será exequível reaver a totalidade dos 3,2 mil milhões de euros que os contribuintes emprestaram à companhia. Mas sobre o pagamento de dividendos ao Estado nada foi dito até ao momento.
O antigo presidente da TAP, Manuel Beja, chegou a apontar no Parlamento que o pagamento de dividendos é a “forma mais direta de reembolsar o Estado”. Também a antiga CEO, Christine Ourmières-Widener, sempre defendeu que a TAP queria pagar aos portugueses “o mais rapidamente possível”.
Lufthansa e AF-KLM vão a jogo
A Lufthansa anunciou na quinta-feira que vai a jogo na TAP no processo de privatização da companhia aérea portuguesa. A companhia aérea alemã entregou manifestação de interesse, juntando-se assim à Air France-KLM.
A empresa alemã diz que, além de comprar uma participação minoritária, o seu objetivo é “estabelecer uma parceria de longo prazo entre a Lufthansa e a TAP de forma a assegurar o sucesso futuro da TAP”. “O nosso objetivo é reforçar a conetividade global de Portugal, preservar a identidade portuguesa da TAP e assegurar o crescimento sustentável da companhia aérea”, segundo Carsten Spohr, presidente da Lufthansa.
A TAP Air Portugal é de uma “grande importância estratégica para a indústria de aviação europeia. Continuamos a ver a Lufthansa como o melhor parceiro para a TAP e para Portugal”. A companhia destaca que está ativa em Portugal há mais de 70 anos com mais de 280 voos semanais para o país.
E recorda o seu investimento na unidade da Lufthansa Technik em Santa Maria da Feira, para reparação de peças de motor e de componentes de aviões.
Destaca que é o número um global, fora os EUA, e que oferece a “experiência necessária, tamanho e estabilidade financeira para criar valor sustentável e reforçar o papel da TAP como embaixador do país em todo o mundo”.
A Air France-KLM entregou na terça-feira à Parpública a sua manifestação de interesse com vista a participar no processo de privatização da TAP. “Uma vez mais, fica demonstrado o forte e continuado interesse da Air France-KLM neste processo. Aguardamos com expectativa os próximos passos”, disse fonte oficial da companhia ao JE.
Os interessados na reprivatização de 44,9% da TAP têm até às 16h59 do dia 22 de novembro para demonstrarem oficialmente o seu interesse na privatização.
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