1. O grupo TAP passou de 21 milhões de euros de resultados positivos em 2017, para prejuízos no valor de 118 milhões em 2018.

O Conselho de Administração desfez-se em justificações de natureza diversa: aumento do preço dos combustíveis, indemnizações a clientes por atrasos e cancelamentos de voos… Sobre aspectos de gestão ou erros de estratégia, nada.

Fico com a “pulga” atrás da orelha, quando as malfeitorias nas empresas/grupos económicos ou até na vida pessoal decorrem sempre de causas exteriores. Mas, segundo se ouve, nem tudo terá corrido bem em termos de decisões dos responsáveis da TAP. Parece ter havido alguma precipitação em decisões de gestão da frota, sobretudo na aquisição de novos aparelhos, sua adaptação e utilização. Enfim, abandonemos essa linha de análise, deixando-a para especialistas fortemente credenciados!

Mas, quem sabe, se estas e outras decisões pouco ponderadas não tiveram impacto nos resultados actuais e sobretudo nos futuros…! A realidade, porém, é que, no ano de 2018 com estes prejuízos, veio a agravar-se ainda mais a situação negativa dos capitais próprios da TAP que, em finais de 2018, assumiram o valor negativo de 618 milhões de euros. O que equivale a uma TAP tecnicamente falida.

2. O problema que, mais cedo ou mais tarde, pode vir a colocar-se é o da necessidade de um aumento de capital, caso a TAP com a “sua estratégia de desenvolvimento” não apresente perspectivas objectivas e sólidas de que consegue reverter este estado de falência técnica que tem vindo a deteriorar-se.

Com esta situação se prende um constrangimento – o do seu estatuto.

Para todos os efeitos, a negociação levada a cabo entre o actual Governo e a parte privada da TAP – após o descalabro da privatização pelo governo anterior, em circunstâncias de opção deveras ideológica e legalidade algo duvidosa, uma e outra contra os interesses do País –, transformou a TAP num grupo privado em termos de gestão e público quando precisa de dinheiro.

Ora, num aumento de capital, é este o estatuto que vem ao de cima e todos conhecemos os imbróglios que daí decorrerão em termos de enquadramento na filosofia da União Europeia (a célebre questão das ajudas de Estado!).

3. Vamos admitir a necessidade de um aumento de capital na TAP.

Nos termos da negociação havida entre o Governo e a parte privada e para que não haja recuo de objectivos expressos que presidiram à negociação – criação de condições para intervenção qualificada do Estado na TAP – um aumento de capital, seja em que montante for, exige, por conseguinte, por parte do Estado, a subscrição de, no mínimo, 50% desse montante.

Os problemas que se vão colocar no quadro da legislação em vigor na União Europeia assumem uma complexidade específica, pois vai ter de se demonstrar que não se trata de ajudas de Estado, mas da necessidade de recapitalização, o que traz neste caso um programa de restruturação que nem sempre é fácil de acomodar nas exigências da União. Os departamentos europeus que tratam estas matérias, como a DGCom & Cª., têm “esquemas” nem sempre de grande lógica económica.

4. Mas a renegociação havida de reversão não terá ficado muito aprimorada. E daí o “sururu” que aconteceu com a distribuição de prémios de desempenho. Alguns excessos de linguagem que a nada conduziram.

O primeiro-ministro António Costa disse que o modelo que a comissão executiva da TAP usou na distribuição de 1,171 milhões de euros por 180 quadros da TAP é “incompatível com os padrões de sobriedade” que devem nortear as empresas participadas pelo Estado. Pedro Nuno Santos, ministro da tutela, ainda foi mais longe e falou de uma “quebra de confiança”, presume-se, entre a comissão de gestão e o Governo.

Tudo palavras “bonitas”, mas um tanto ocas. Palavras tão fortes e robustas, para quê? Para criar um simples comité para fins futuros?! Uma estrutura que é comezinha existir em qualquer empresa pública ou privada de certa dimensão. Sendo mais objectivo, as reacções públicas governamentais foram de resultado zero. Os quadros que receberam o cheque vão certamente ter umas férias de verão bem simpáticas, (pois não consta que o tenham devolvido), podem fazer uma programação de luxo, e quem sabe se a pensarem já num segundo cheque no próximo Verão!

Nada tenho contra a distribuição de prémios de desempenho, quando baseados em regras seguras e transparentes. Não fiquei, contudo, ciente que a distribuição de prémios da TAP, este ano, tenha sido assim tão linear. E abro aqui ainda um pequeno parêntesis para dizer que esta situação não se confunde com a distribuição de dividendos superior aos lucros, como ocorreu nos CTT – uma questão de outra natureza.

Deduzo, contudo, que o modelo para o grupo TAP que foi instituído entre o Governo e a parte privada não prima por uma delimitação clara do papel da intervenção que o Estado deveria ter num grupo de tamanha importância estratégica para o País, símbolo da nossa soberania nacional, uma âncora fundamental para o turismo e de ligação às comunidades portuguesas no estrangeiro. Importante, por conseguinte, a defesa desta Companhia de Bandeira e a sua integração na estratégia de desenvolvimento de Portugal em toda a sua dimensão.

A ideia de reversão da TAP foi muito acertada e nem ideológica se pode considerar, ao contrário da privatização pelo governo de Pedro Passos Coelho. Mas o estatuto definido entre as partes não possibilita a intervenção que o Estado deve ter na estratégia do grupo TAP.

O que se defende então?

Tem de haver, atendendo à importância política, económica e social da TAP, uma renegociação para acerto de rota, que aprofunde e contribua para a clarificação dos campos e mecanismos de intervenção de cada uma das partes, parte pública e parte privada, sem o que a reversão da privatização não passa de um simples simbolismo, com poucos efeitos práticos. O Estado não pode ficar alheio à gestão estratégica da TAP. Tem de ter um papel determinante. Parece que a máxima de “um Estado, dois regimes” não funciona neste caso.

5. Alguns números sobre a importância económica da TAP (2018):

  • 827 trabalhadores, com a previsão de aumento de emprego, designadamente ao nível de pilotos;
  • Receitas de 3.251 milhões de euros contra 2.978 milhões em 2017, dos quais mais de 2 mil milhões são exportações;
  • 15,8 milhões de passageiros transportados;
  • “HUB” Lisboa, o que significa dispor do centro operacional principal nesta cidade.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.