Uma das frases mais emblemáticas de um programa de comédia brasileiro, “Sai de Baixo”, era “tenho horror a pobre!”. Na semana passada, lembrei-me desta frase por uma experiência que tive, onde me questionei se os responsáveis de uma marca de luxo não estariam a pensar o mesmo dos clientes, independentemente da capacidade financeira destes.

Este ano celebro 20 anos de casada. Não é forçosamente um feito extraordinário, nem é a celebração das bodas de prata, mas decidimos comprar umas alianças novas (até porque chegar aos 25 anos não está de todo garantido!). E decidimos comprar alianças de uma marca de joalharia de luxo – uma pequena extravagância.

Como estávamos em Amsterdão, aproveitaríamos para visitar a rua Cornelis, famosa pelas suas lojas de luxo. Indo com disponibilidade para comprar e na expectativa de algo extraordinário, fomos confrontados com tudo o que não é uma boa experiência de cliente.

Os nomes e marcas que agraciavam as fachadas prometiam, mas tal não passava de uma promessa. A maioria das portas estavam trancadas. Para aceder aos produtos expostos nas montras cintilantes era necessário tocar à campainha, aguardar pacientemente enquanto alguém pouco gentil abria a porta, na maioria dos casos através de um comando que teimava em não funcionar corretamente. Em muitas situações as portas eram duplas, ou seja, ficávamos a aguardar num vestíbulo apertado e quente, com mais clientes esperançosos em gastar o seu dinheiro arduamente ganho.

Havia ainda as griffes que comandavam filas e filas de espera na rua, apesar das lojas se encontrarem essencialmente vazias. Neste dia em particular, fazia calor e estava sol em Amsterdão e, convenhamos, a tez natural da maioria dos holandeses e uma espera longa ao sol não combinam de forma feliz. Assim, lá ficavam à espera de ter acesso ao quadrado de seda da Hermès enquanto se transformavam, lentamente, em lagostins cozidos.

Questionei-me: por que razão as marcas de luxo nos tratam assim? Se quando me dirijo a lojas e marcas de commodities, tudo menos luxuosas, e me deixam à espera fico impaciente. Afinal, o que motiva pessoas com capacidade de comprar produtos de luxo a sujeitarem-se a esta espera?

Em grande medida, compramos produtos de luxo de forma irracional, em muitos casos porque melhoram a nossa autoestima. Na realidade, é puro hedonismo que resulta do prazer e satisfação da aquisição mais do que do valor intrínseco do produto. Nesta perspetiva, e de um ponto de vista pessoal, pergunto-me se várias marcas de luxo não utilizarão este tipo de experiência, diria quase dolorosa, para fazer sentir que é muito difícil chegar ao produto, tornando-o assim restrito e ainda mais valioso?

Em suma, apesar de continuar casada não comprei as alianças e vim com um sentimento claro de que essas marcas não gostam de mim (sentimento retribuído) e vou continuar a fazer as minhas compras na Avenida da Igreja, em Lisboa, onde as portas estão abertas e me sinto bem tratada.