O Manifesto Agile, já com 20 anos, tem vindo a marcar profundamente o mundo das empresas. Surgiu como solução para um problema técnico que afligia os profissionais das TI, com destaque para as múltiplas solicitações dos clientes e para as muitas dificuldades nas respostas, uma vez que as questões eram cada vez mais sofisticadas e as respostas lentas e incompletas.

A necessidade expressa por um desejo – a satisfação do cliente -, rapidamente evoluiu para uma filosofia onde colaboradores e clientes se tornaram mais que os produtos, processos e procedimentos. Num mundo onde as ferramentas não representam a verdadeira mudança na atitude e comportamento, preenchem cada vez mais o quotidiano e onde o tangível se assume como o único valor, o Agile veio ajudar a reformular as empresas a reposicionarem o porquê da sua existência, qual a verdadeira origem pelo qual fazem o que fazem. Não na distribuição de dividendos, que é um resultado, mas numa estratégia para serem quem são.

Esta alteração no pensamento estratégico teve repercussões nas empresas em todo o mundo, porque clientes e colaboradores passaram a ser vistos na mesma ótica – a razão de existir – e o foco passou a ir além da retribuição tangível. Definiu-se uma estratégia, um motivo, uma ética, para cada dia de trabalho e criou-se a necessidade de transformar, da mesma forma, as outras áreas da empresa para responderem com o mesmo modelo mental.

Mais do que a qualidade, as especificações ou o preço, é o marketing orientado ao cliente que fideliza, bem como os Recursos Humanos focados na capacitação das equipas e não no preenchimento de lugares e qualificações somente técnicas ou foco no individuo. Da mesma forma é fundamental orientar os objetivos como um todo, mantendo a identidade da empresa, e não tendo apenas como fito a remuneração de desempenho do indivíduo.

A preocupação excessiva das TI com a simplicidade e segurança no contacto com o consumidor, em detrimento da segurança interna dos sistemas, bem como o suporte a cliente onde a procura de respostas padrão extraídas de um manual, tornaram-se insuficientes para responder às necessidades dos clientes. A frase “não está ninguém responsável”, “compreendo mas não posso fazer nada porque é um processo” foi substituída por “vou procurar resposta e já o contacto, não se preocupe, está em boas mãos e nós vamos encontrar a solução que precisa” ou “não temos fidelização por obrigação, pois vai gostar tanto do nosso produto/serviço que paga mais 1€ só para manter este serviço operacional”.

Da importância e domínio avassalador de empresas como a Kodak ou a Blockbuster, da banca aos seguros, ou dos governos e respetivos serviços, onde a rigidez estrutural obriga a rígidos constrangimentos, as decisões muito verticalizadas caíram com estrondo por incapacidade de adaptação, assim evoluiu-se para empresas que reagem bem à mudança, como a Apple, a Amazon, ou as Fintech/Insurtech. Estas apostaram nas necessidades do consumidor sem perderem a razão da sua existência, em detrimento de procedimentos, burocracias e silos internos. Fazem menos, mas com mais impacto! Foram as grandes empresas que construíram os seus grandes problemas, e não os clientes, devido ao controlo desmesurado das áreas de atuação, aos egos, aos silos, aos processos e constrangimentos e modelos de decisão e à falta de acompanhamento dos colaboradores para que soubessem como tratar os clientes.

Quanto vale ganhar um cliente e quanto vale perder um? Certamente os valores são muito diferentes.

Este foco no consumidor, a versatilidade e maleabilidade da estrutura empresarial e a importância do trabalho em grupo na organização encontrou nas três leis do Agile (@stevedenning) o suporte necessário para, de forma progressiva, ser aceite em muitas empresas.

A “Lei de equipas pequenas”, que se adaptam rapidamente às alterações do mercado, pela autonomia que ganharam com a confiança do seu trabalho, procurando de forma continua novas soluções;  a “Lei de utilizar a Rede de Contatos”, que articulando o conhecimento diversificado de cada colaborador, sem receios de penalização por falhar e onde a certeza é substituída pela plausibilidade; e a “Lei do Consumidor”, onde se procura antecipar as suas necessidades, ouvir e estar atento, permitindo uma fidelização pela imagem de um amigo e não pelo preço, fazem o pleno desta filosofia.

As entregas frequentes e o foco no que o consumidor necessita, e não no que o chefe precisa de mostrar para ser promovido, ou o que uma consultora decidiu ser importante para os Cientes do seu Cliente sem tão pouco utilizar o produto, tem vindo a perder apoiantes e interessados em candidatar-se a lugares de trabalho com esta filosofia, rotina, forma de pensar, de estar e de ser.

É esta ética ou estratégia empresarial que está hoje no centro das empresas que procuram a filosofia Agile, tornando a sua adoção um equívoco muito em voga para quem aprecia chavões ou certificações. O Agile pratica-se de forma continuada entre colaboradores e clientes, na procura de parceiros que partilhem a mesma visão da empresa para os seus produtos e serviços. Se não partilha destes valores, princípios e transparência, então o Agile não é para si. Se pretende manter o Status-Quo e ter apenas equipas a fazer cursos de Agile e comprar ferramentas Agile, então servirá de muito pouco, pois nenhum cliente irá pagar mais 1 euro para Ter Agile.