A eleição de Donald J. Trump trouxe consigo a estupefação inicial e imprevisibilidade no presente e no futuro. Aliás, parece não existir melhor característica para a próxima presidência norte-americana que esta: imprevisibilidade. Alguns traços das ações do Presidente eleito nas últimas semanas denotam que não abandonou o estilo que usou na sua campanha.
Para além de uma versatilidade discursiva notável, do recurso aos media sociais, sobretudo o Twitter, para se dirigir diretamente ao seu eleitorado, mostra uma capacidade invulgar para usar em favor do populismo a expectativa em relação ao seu próximo passo. Trump sabe que as suas primeiras ações enquanto presidente da maior potência mundial são ansiosamente acompanhadas e usa isso em favor do incremento da imprevisibilidade, como se tratasse de um filme de suspense.
Dois casos exemplificam na perfeição este clima deliberadamente criado pelo Presidente eleito dos EUA. Comecemos pela política interna. Donal Trump ainda não fez nenhuma nomeação oficial, das 662 que terá de fazer. Anunciou 12 dessas nomeações que não foram confirmadas. A nomeação mediatizada e não confirmada encaixa na perfeição na “sociedade do espetáculo” que Trump pretende manter até ao último detalhe. Tal como mantém suspensas todas as nomeações para uma tomada de posse que será já a 5 de Janeiro, com uma época natalícia pelo meio. Ao deixar que se crie ruído em torno das nomeações, o Presidente eleito vai tomando o pulso às reações gerais e vai ganhando mais espaço no clima de imprevisibilidade que deixa os seus oponentes com pouco tempo para reagir.
Na política externa, Trump age da mesma maneira. O recente caso do telefonema entre Trump e a Presidente de Taiwan terá sido o primeiro contacto entre uma figura já representativa do Estado americano e um responsável político de Taiwan nos últimos 40 anos, ou seja, desde que os EUA assumiram a política externa de uma “China única”. Esta política apenas admite relações diplomáticas com a República Popular da China, mas permite relações económicas com Taiwan. A ambiguidade da política externa norte-americana relativamente a este caso particular tem, contudo, comportado esta previsibilidade de quem representa politicamente o país. Claro que o telefonema levantou receios de alguma reação por parte da República Popular da China, quando em Taiwan existe uma presidente com um discurso pró-independência. No entanto, rapidamente os protagonistas chineses desvalorizaram o telefonema e houve mesmo quem referisse nos media, enquanto analista, que “um telefonema não é diplomacia”.
Este telefonema permitiu a Trump lançar no Twitter um parágrafo que, falando diretamente ao eleitor, dizia que os EUA podem agir em qualquer cenário, sem medo de reações. Enquanto isso, o seu vice-presidente serenava os ânimos públicos, falando apenas de um telefonema sem repercussões políticas. Controverso? Não, apenas populista e suficientemente imprevisível para tornar a ação política presidencial num jogo que bem podia chamar-se “tiro no escuro”.