A propósito do Projecto de Resolução do PCP de oferecer um exemplar da Constituição da República Portuguesa a cada estudante do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário, tortuosas reflexões foram produzidas. O tosco raciocínio parece ser o seguinte: o PCP votou contra as sucessivas revisões da Constituição (absteve-se numa); estas alteraram o texto constitucional; logo, não se compreende, não faz sentido, que o PCP defenda a Constituição e queira fazer aquela oferta!
É de facto lamentável que várias almas não consigam ir mais longe… E se começassem por se interrogar sobre qual será a avaliação global que o PCP fez/faz da Constituição assim revista?! O que julga o PCP do texto depois de amputações e subversões do original e contra as quais se bateu? Com esta estranha lógica seria de se questionarem porque é que o PS, PSD e CDS, mesmo após essas sete revisões, continuaram a incumprir em tanta coisa a Constituição? Porque é que continuam a contestar e até a anunciar a vontade de nova revisão?!
Um esforço de rigor e seriedade, e até uma rápida investigação, impediria certa gente, alguns dos quais ostentam o título de “professor catedrático”, de proferir alarvidades. Não há qualquer incoerência ou contradição entre o posicionamento do PCP no debate parlamentar das revisões constitucionais e a sua recente proposta de melhorar substancialmente a literacia constitucional dos jovens portugueses, até para que compreendam e assumam o “tesouro” que herdam do 25 de Abril. Mesmo se algum ouro foi roubado e alguma prata corroída.
Essas almas poderiam ter perguntado ao PCP, ou consultado o Preâmbulo da sua iniciativa parlamentar. Ou mais simples ainda: poderiam ler o que foi escrito por Jerónimo de Sousa como Prefácio à edição da Constituição pela Editorial «Avante!», que o PCP fez em 2006, após a 7.ª revisão constitucional, 2005 – no aniversário dos 30 anos da sua aprovação. (E que se saiba, mais nenhum partido fez coisa semelhante, mesmo depois das suas malfeitorias de revisão!):
“(…) Essas forças conservadoras e de direita, em conluio com o PS, através de sucessivas revisões, da não efectivação das suas normas e projecto, deixaram-na mais pobre, menos democrática e menos avançada. Como obra humana precisava de ser aperfeiçoada. Mas as alterações que sofreu foram quase sempre no sentido do retorno ao passado e não para a adaptar e afeiçoar em relação ao futuro.
Apesar disso, ainda inscreve em termos globais o sentido da ruptura, da transformação, de progresso, de justiça social e de democracia como emergência e matriz da Revolução de Abril. (…)”
Será que dá para compreender o porquê de a defendermos e a colocarmos na linha da frente da agenda política, como chave-mestra para a resposta aos graves problemas que o país enfrenta? Será que dá para compreender que a grave situação do país e dos portugueses decorre do seu não cumprimento, por insistente e persistente violação de princípios e imperativos constitucionais, por omissão e sistemático desvirtuamento pela política de direita de sucessivos governos do PS, PSD e CDS, inclusive do actual?
Coitados. Com a cabeça enxofrada de anticomunismo e reaccionarice querem também enxofrar a cabeça dos portugueses.