É frequente falar-se da baixa taxa de desemprego como justificação para o facto de que, afinal, há muito trabalho. Nos Estados Unidos, por exemplo, ela está em 3,8%, a mais baixa de há décadas. E, em Portugal, os progressos dos dois ou três últimos anos são também notórios e positivos.
Um desempregado, segundo a definição da OCDE, é alguém que, não tendo trabalho, procurou ativamente quem o empregasse ao longo dos últimos trinta dias. Quem não estiver a trabalhar ou não tenha procurado trabalho ao longo dos últimos trinta dias é considerado como estando fora da população ativa e, portanto, não conta para os cálculos da taxa de desemprego. Será este um critério aceitável nos tempos que correm?
O “New York Times” publicou recentemente um interessante artigo sobre esta matéria, referindo-se apenas aos EUA. Nele se diz que, enquanto em 1950 apenas 14% dos homens estavam fora da população ativa, hoje essa percentagem é de 31%. O artigo sublinha duas razões virtuosas que contribuem para tal: o aumento dos anos de escolaridade e o envelhecimento da população já que a esperança de vida aumentou cinco anos neste período. E há uma terceira. A percentagem de mulheres integradas na população ativa passou de 43 para 66%. De onde o título irónico desta coluna.
Mas, há um lado bem mais sombrio que se adivinha (e comprova) numa análise mais fina. Se observarmos o grupo etário de homens ativos situado entre os 24 e os 55 anos, um grupo não afetado por nenhuma das três boas razões pelas quais há cada vez menos homens a trabalhar, verificamos que também aí a percentagem de inativos passou de uns meros 4% em 1950 para uns significativos 11% hoje.
E este fenómeno tem umas tantas caraterísticas nossas conhecidas. A primeira é que são os menos instruídos que mais perdem e abandonam o trabalho. A segunda é que o trabalho dessas pessoas desapareceu porque foi substituído por robots ou porque foi transferido para países onde os salários são mais baixos.
E, sendo assim, quais estão a ser as consequências para a sociedade norte-americana?
Todos sabemos, por exemplo, que a taxa de dependência de opióides de prescrição médica e drogas ilícitas naquele país não tem paralelo no mundo. Quase 64.000 americanos morreram de overdose nos EUA em 2016. Isso equivaleria a 2.000 mortes por ano em Portugal. Ora, em 2017, apenas 208 pessoas morreram por overdose em Portugal. Uma taxa quase dez vezes menor. E, no nosso país, esse número é decrescente enquanto ele continua a expandir-se nos EUA.
A taxa de suicídio em Portugal (e na União Europeia) é de 11 indivíduos por 100.000 habitantes. Oitenta por cento dos suicídios são de homens. Evolui de forma errática, mas pode ser considerada estável. Nos EUA ela está a aumentar. Em 25 estados, ela aumentou mais de 40% entre 1999 e os dias de hoje, situando-se agora nas 15,6 pessoas por 100.000 habitantes e também oitenta por cento são de homens.
Não sou sociólogo. A correlação entre estes dois indicadores e a taxa de ocupação masculina é minha, talvez abusiva e um pouco grosseira. Mas convém perguntarmo-nos se não estamos já a ver aqui os efeitos avançados do desaparecimento do trabalho e da sociedade de transição
(eufemismo dos paladinos da Inteligência Artificial e dos defensores da automatização do trabalho) que teremos que atravessar para chegar ao patamar de bem-estar e conforto para todos que nos prometem.
O trabalho é o maior instrumento de socialização e criação de riqueza para os que não têm capital. Se ele desaparece, desaparece a motivação para a vida. Trabalhar é de homem e de mulher. Estar sem trabalho desumaniza-nos.