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Transportes ferroviários e alfândegas são os principais obstáculos ao desenvolvimento do sector logístico em Portugal

“Relativamente à utilização dos diferentes modos de transporte, continua a verificar-se uma forte dependência do transporte rodoviário, com impactos negativos ao nível da sustentabilidade ambiental”, destaca, em exclusivo ao Jornal Económico, Raul de Magalhães, presidente da Aplog, referindo-se a um das conclusões do estudo feito em parceria com a consultora KPMG.
21 Abril 2021, 08h10

A Aplog – Associação Portuguesa de Logística apresentou esta terça-feira, em formato digital, as conclusões do estudo ‘A Logística em Portugal – Inovação, Tendências e Desafios do Futuro”, encomendado à consultora KPMG.

O evento contou, entre outros, com a presença de Pedro Siza Vieira, ministro de Estado, da Economia e da Transição Energética; e de António Costa e Silva, autor do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência.

Em exclusivo ao Jornal Económico, Raul de Magalhães, presidente da Aplog, revela as principais conclusões desse estudo, com destaque para a necessidade de uma aposta crescente na digitalização e para o alerta para dois constrangimentos que retardam o desenvolvimento do sector no nosso país: a fraqueza do sector ferroviário nacional e a burocracia das alfândegas.

Quais são as principais conclusões do estudo sobre o sector da logística em Portugal que a Aplog efetuou em parceria com a KPMG?
Tratou-se de uma relação de parceria e trabalho conjunto, que abrangeu igualmente as empresas e associações que deram um significativo contributo para o enriquecimento deste estudo, bem como o apoio de alunos de mestrado do ISCTE.

O sector está pujante e dinâmico, de forma heterogénea nos seus vários segmentos, tendo no entanto, pela frente fortes desafios de transformação para corresponder à ambição que os planos económicos do país e as suas necessidades e prioridades lhe impõem.

As empresas clientes de serviços logísticos, englobadas neste estudo, identificaram um conjunto de desafios associados à gestão e reconfiguração das suas cadeias logísticas, que de uma forma geral, se alinham com as principais tendências globais desta área, nomeadamente, a intensificação da volatilidade e incerteza na procura, o efeito da omnicanalidade e da digitalização, e a premência na sustentabilidade das operações, tendo identificado alguns aspetos críticos associados aos constrangimentos do contexto português e às limitações da oferta de serviços logísticos em Portugal.

Do ponto de vista da oferta de serviços logísticos em Portugal, esta tem vindo a evoluir e a adaptar-se ao contexto da internacionalização e globalização da economia nacional e aos novos requisitos e padrões da procura, de empresas e consumidores, continuando, no entanto, a verificar-se alguns constrangimentos estruturais, quer ao nível das infraestruturas logísticas do País, quer ao nível da maturidade e competitividade das empresas, fornecedoras deste tipo de serviços. Por exemplo, relativamente à utilização dos diferentes modos de transporte, continua a verificar-se uma forte dependência do transporte rodoviário, com impactos negativos ao nível da sustentabilidade ambiental.

Quais são as principais tendências e desafios do sector no nosso país, identificados por esse estudo?
Alguns dos principais temas que estarão na agenda dos próximos anos, podem ser de alguma forma sistematizados em três perspetivas: evolução da procura, estruturação da oferta e alterações no contexto regulatório, competitivo, tecnológico, social e de infraestruturas.

Do ponto de vista da evolução da procura, vivemos a ‘Era do Consumidor’, e a centricidade e experiência do cliente passou a estar presente na formulação da estratégia da generalidade das empresas. Isto significa saber lidar com a volatilidade e a incerteza, tendo como consequências a necessidade do fortalecimento das capacidades de planeamento da procura e da cadeia logística, com ciclos muito mais curtos e incorporando de forma inteligente o conhecimento ganho nas interações com o cliente nos múltiplos pontos de contacto.

A agilidade e a velocidade de resposta são igualmente fatores chave para enquadrar os cenários de maior imprevisibilidade, com impactos na extensão ‘end-to-end’ das cadeias, na redefinição das estratégias de ‘sourcing’ e na crescente valorização do ‘near shore’ e da velocidade Vs. custo.

Reconhecimento que modelos ‘one-size-fits-all’ muito dificilmente serão eficientes e eficazes para lidar com os múltiplos segmentos de clientes, apontando para a criação de micro ‘supply chains’.

As exigências da omicanalidade vieram para ficar, mas também outros aspetos têm de ser acautelados, como por exemplo as disrupções no conceito de posse: ‘capacity as-a-service’ e ‘platform sharing economy’, a crescente pressão para o aumento da agilidade da ‘supply chain’ e o desafio na gestão dos recursos: a economia circular.

Do ponto de vista da oferta, a necessidade de incorporar as transformações a jusante, impelidas pela procura, e a montante, consequência da forma como a oferta se está a estruturar, o próprio contexto de atuação das cadeias logísticas está em forte transformação. Aspetos regulatórios, com particular destaque para a descarbonização da economia, alterações tecnológicas que criam novas capacidades internas e um novo nível de conetividade externo, múltiplas fontes de risco para as quais é necessário criar resiliência, novos modelos de negócio que conflituam com o ‘status quo’, atração e retenção do talento digital, são alguns dos pontos que estão a induzir esta mudança de contexto de operação.

Segundo esse estudo, de que forma é que o sector logístico nacional compara com os seus congéneres e como se enquadra nas redes logísticas globais?
No LPI (‘Logistics Performance Index’), verifica-se uma evolução positiva da ‘performance’ da logística nacional em quase todas as vertentes, entre 2014 e 2018, com destaque para as dimensões ‘International Shipment’ e ‘Timeliness’.

Comparando com a Alemanha, o ‘top performer’ de 2018, existem défices em todas as dimensões, sendo a dimensão ‘International Shipments’ aquela onde o ‘gap’ é menor e onde evoluímos mais nos últimos anos, fruto da evolução positiva dos portos nacionais.

Na vertente negativa, há uma diminuição de performance em customs e infrastructure, sendo de evidenciar os constrangimentos nos processos alfandegários, a burocracia e os tempos a ela associados, não sendo muitas vezes compatíveis com a necessidade de crescimento de uma economia que quer privilegiar a exportação, e por outro lado, ao nível das infraestruturas. Muito ainda há a fazer na intermodalidade e na eficiência das operações ao serviço de corredores e fluxos logísticos.

Em termos gerais, confirma-se a vitalidade do sector logístico nacional, embora os volumes de investimento reportado pelas empresas e as deficiências conhecidas no que tange a infraestruturas de transporte, em particular ferroviário, sejam preocupações importantes para um sector que será vital para materializar a ambição nacional de crescimento dos sectores produtivos, com especial foco na vertente de exportação.

Por outro lado, no que respeita à vertente interna, a busca constante pela eficiência, as mudanças ao nível dos hábitos e padrões de consumo, decorrentes da pandemia e de um anunciado período de reconstrução económica, colocam à logística interna das empresas e aos prestadores de serviços logísticos um conjunto de desafios, que se detalham no último capítulo deste estudo.

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