Posteriormente, e no contexto de um conjunto de medidas inseridas no âmbito das ações de combate à evasão e fraude fiscais contidas na reforma fiscal de 2001, o legislador optou por alargar a base das realidades (leia-se “despesas”) sujeitas a tributações autónomas, sendo que a partir daí poder-se-á dizer que se iniciou a “escalada” de tributações autónomas a que temos vindo a assistir em Portugal.  Neste âmbito, passaram a estar contempladas nesta realidade das tributações autónomas, designadamente, despesas de representação, despesas com viaturas, despesas com ajudas de custo, entre outras.

Efetivamente, as empresas incorrem frequentemente em algumas despesas, relativamente às quais, dada sua natureza, não é possível aferir com exatidão o grau da respetiva natureza de “empresarialidade”. Nesse contexto, a figura das tributações autónomas visa desincentivar o uso para fins não empresariais de determinadas tipologias de despesas que, à partida, são suscetíveis de gerar gastos dedutíveis em sede de IRC, quando o facto que motivou o respetivo dispêndio não se afigura totalmente (i.e. numa base de 100%) alinhado com o carácter empresarial e/ou de indispensabilidade da mesma.  Pode ainda ser entendido que a utilização da figura da tributação autónoma foi uma forma hábil que o legislador utilizou para vir a tributar uma alegada remuneração em espécie que os colaboradores das empresas acabam por ter através do benefício propiciado pelos gastos incorridos, o que, regra geral, não ocorre.

Paralelamente, com o passar do tempo foi-se ainda assistindo a um aumento substancial das taxas de tributação a aplicar às realidades sujeitas a tributação autónoma.  Por essa razão, as tributações autónomas passaram a ser uma importante fonte de receita em sede do IRC.  De facto, é líquido afirmar-se hoje que o IRC já não é apenas um imposto que incide sobre o rendimento das pessoas coletivas, mas também um imposto que, em certa medida, incide sobre determinados gastos.

Em face de um paradigma crescente de sofisticação e incremento significativo do volume das tributações autónomas, os contribuintes começaram a entender que a coleta do IRC, lato sensu, não se restringe apenas ao valor do imposto resultante da aplicação da taxa nominal ao valor da matéria coletável, mas também à coleta de imposto que resultasse das tributações autónomas.  É neste quadro que vários Contribuintes começaram a desencadear processos de recuperação de valores de IRC por considerarem que ao valor da coleta de imposto referente às tributações autónomas se poderia deduzir pagamentos especiais por conta e benefícios fiscais que operam por dedução à coleta.  Esta situação gerou, inevitavelmente, múltiplos processos de contencioso tributário e acesas discussões técnicas que acabaram por vir a ser dirimidas, muitas vezes, na via judicial.

Analisando especificamente as posições tomadas em sede arbitral, especificamente pelo Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), é possível constatar, por recurso a uma amostra de 65 decisões sobre a dedução de benefícios fiscais à coleta do IRC produzida pelas tributações autónomas, a existência de 38 decisões a favor dos Contribuintes e 27 decisões contra!  Ou seja, estamos longe de haver uma uniformidade interpretativa sobre esta temática.  Com isto, a segurança jurídica que se pretende ter do lado dos Contribuintes é, de certa forma, posta em causa.

Com o objetivo de tentar acabar com a controvérsia em torno desta matéria, o legislador, através da Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2016 (igualmente com a Lei do Orçamento do Estado para 2018), introduziu no Código do IRC, com alegado carácter interpretativo, uma norma no sentido de explicitar que ao montante global apurado a título de tributações autónomas não são passíveis de efetuar quaisquer deduções.

Contudo, pelo que temos vindo a assistir, a discussão continua no que respeita aos exercícios anteriores a 2016, designadamente pelo facto de o tribunal constitucional já se ter pronunciado sobre a inconstitucionalidade da natureza interpretativa que veio a ser conferido à referida norma.

Assim, no caso de Contribuintes que ainda possuam montantes de benefícios fiscais suscetíveis de dedução à coleta por utilizar e em que as tributações autónomas possam ser a única forma de utilização dos mesmos, poder-se-á questionar qual o procedimento a adotar.  Um coisa é certa, ainda que possam existir argumentos técnicos que permitam sustentar essa posição, haverá, com certeza, matéria que potencialmente pode vir a gerar contencioso fiscal.  Por isso mesmo, seria francamente positivo que existisse uma clarificação final e definitiva sobre esta matéria por parte das entidades competentes.