Antes de se reunir com Putin na cimeira de Helsínquia de 16 de julho, Donald Trump, numa entrevista à CBS News, identificou os inimigos dos EUA. Uma lista que incluía a União Europeia e a China, identificados como inimigos económicos, e a Rússia, um inimigo em vários aspetos.

Como se percebe, o critério valorizado por Trump foi económico e, como tal, os países ou blocos que desafiam a sua política económica passam a fazer parte da versão revisitada do eixo do mal. Nada de novo se for tida em conta a prestação de Trump na cimeira da NATO. Uma reunião em que ameaçou bater com a porta e sair da organização se os restantes membros não aceitassem pagar mais e com mais rapidez. Leia-se: cada país passar a contribuir para a NATO, desde já, com 4% do PIB e não com os 2% previstos até 2024.

As declarações de Trump em Londres deixaram claro que os parceiros tinham aceitado as suas imposições. Algo que o comunicado final não confirmou. Situação que não implicou a saída dos EUA da NATO, nem qualquer desmentido ou esclarecimento por parte de Trump. Um líder que personifica a maneira norte-americana de estar no mundo.

Várias décadas atrás, aquando das negociações para a utilização pelos EUA da base das Lajes, Salazar, na sequência da receção ao embaixador dos EUA em Portugal, escreveu que “tudo é oportunismo e interesse; tudo deve ser disposto à satisfação destes”. Uma frase que completaria ao frisar que o embaixador “nunca chegará a compreender que os Estados Unidos não têm título para pedir a Portugal favores ou serviços contrários à neutralidade”.

A forma como Trump conduz a política externa exemplifica na perfeição a conceção estadunidense das relações internacionais. A sua personalidade só torna mais vincada uma caraterística pré-existente. Algo que os europeus, sobretudo aqueles que não têm proveniência anglo-saxónica, manifestam dificuldade em compreender.

Trump reforça no presente o pensamento do britânico Lord Palmerston quando afirmou que a Inglaterra não tinha amigos eternos nem inimigos perpétuos. Os interesses ingleses é que eram eternos e perpétuos e ao Governo cabia defendê-los.

Por isso, Trump julga-se no direito de anunciar 22 medidas comerciais contra a China ou uma taxa alfandegária de 25% sobre o aço e 10% sobre o alumínio provenientes da EU, e espera que Pequim e Bruxelas aceitem essas imposições sem protestos e, muito menos, retaliações contra empresas e produtos norte-americanos.

Para o Presidente da Terra do Tio Sam, a palavra “reciprocidade” não consta do respetivo vocabulário e não integra o normativo que regula as relações internacionais.

Felizmente, o fim do unilateralismo estadunidense traduziu-se na criação de vários centros de decisão e no consequente multilateralismo. Uma forma de limitar a dependência da UE relativamente à superpotência norte-americana. Sobretudo se a União quiser fazer jus ao nome.

Só graças a isso é que poderá deixar de vigorar o receio expresso por Salazar quando disse: “podemos mesmo chegar a ponto de lhes dar todas as facilidades…”.