Uma guerra comercial é um jogo de soma negativa, ou seja, até pode haver alguns grupos a ganhar com isso, mas o que ganharão será menos do que as perdas sofridas pelos perdedores.
Com Trump entramos num mundo ainda mais absurdo. Em Abril, entram em vigor tarifas sobre os automóveis e partes importados, contra a vontade expressa da generalidade dos construtores de veículos norte-americanos, cujas cotações tiveram uma clara queda em bolsa, em resposta a esta medida. Aqueles que deveriam ser os principais beneficiários desta nova política estão já a ser prejudicados, devendo seguir-se os consumidores, que deverão ter que pagar mais para comprar estes bens.
A razão principal para estas perdas é que a generalidade destes produtores depende de peças importadas, que irão ficar mais caras, encarecendo o produto final.
Há poucas semanas, tinha escrito aqui que as perdas dos empresários e a desconfiança dos consumidores dos EUA poderiam constituir um travão às medidas mais externas do presidente norte-americano, mas, neste momento, estou muito menos seguro disso. De qualquer forma, reitero a recomendação que tinha feito então, de que a UE deveria evitar entrar numa retaliação, ou ter muito cuidado com o seu desenho, para não agravar ainda mais o que já não é nada bom.
Trump já admite mesmo que haja uma recessão e uma subida de preços temporária, sendo esse o preço a pagar, alegadamente, pela “desintoxicação” da economia dos maus hábitos do passado. Trata-se de uma desculpa esfarrapada para a sua cada vez mais incompreensível política economia, mas não parece que o isso o afecte minimamente.
Na verdade, prepara-se algo de muito mais grave nas contas públicas. Para financiar uma baixa de impostos sobre os mais ricos, estão em preparação cortes profundos em prestações sociais e serviços públicos, sobretudo na saúde, que deverão produzir grande sofrimento a milhões de eleitores de Trump. Será que estes cortes avançarão mesmo? Como irão reagir os eleitores? Será que o presidente será capaz de recuar?
Em contrapartida, se os cortes na despesa não avançarem, haverá recuos na diminuição de impostos? Teremos mais défice público, quando este já está demasiado elevado e a dívida pública está numa trajectória preocupante. Até agora, pode-se dizer que o estatuto excepcional da dívida pública dos EUA como o activo de reserva mundial tem permitido muitos excessos a este país, mas Trump está a destruir a confiança do mundo no dólar e poderemos ter grandes surpresas.
A oposição política parece sem Norte e incapaz de capitalizar nos erros óbvios que Trump vem cometendo. Será que este presidente vai poder continuar a tomar o tipo de decisões que tem tomado sem freio? Os pesos e contrapesos do sistema constitucional dos EUA ainda estão a funcionar?