O ano de 2022 foi um ano atípico nos mercados de capitais. Com efeito, nos últimos 150 anos apenas se registaram três anos com uma queda simultânea dos mercados de acções e de obrigações. Para as obrigações de grau de investimento americanas, activo considerado de baixo risco, a desvalorização acumulada foi de 16%! Ou seja, estatisticamente um ano como o de 2022 ocorre de 50 em 50 anos.
Como grande parte dos portfolios são constituídos por ambas as categorias de activos, seja por uma questão de diversificação destes, seja pela capacidade de balanceamento e de redução de volatilidade, o efeito de desvalorização afectou os investidores de longo prazo, como instituições, fundos de pensões, fundos da Segurança Social e até os próprios bancos centrais.
Ora, se estamos perante um evento que não acontecia há 150 anos, torna-se impreterível analisar o porquê e o que podemos esperar de 2023.
O mercado de acções, pressionado pela elevada inflação, que já transitou de 2021, foi sobretudo influenciado pela forte subida dos juros e pela falta de visibilidade das empresas quanto ao futuro, tendo em conta as perspectivas de recessão de mais de um terço da economia mundial e de uma nova onda pandémica que afecta a China.
No entanto, a maior surpresa foi o mercado de obrigações – que tendo vivido numa bolha suportada pelos principais bancos centrais, que compraram biliões de euros destes títulos nos últimos anos – mergulhou numa espiral de quedas contínuas. A contabilidade final deste desastre será feita durante o primeiro trimestre deste ano, quando os fundos geridos pela Segurança Social dos diversos países, e os próprios bancos centrais, apresentarem prejuízos históricos.
As obrigações registaram esta desvalorização pelo efeito de aumento dos juros, que nos EUA foi de 16 vezes, ou seja, de 0,25% para 4%, o que nem na década de 80 ocorreu, quando as taxas subiram de 5% para 20%.
O efeito multiplicador da subida dos juros teve, assim, um impacto exponencial na desvalorização das obrigações, dada a dimensão do ajustamento. A queda das obrigações não reflete, por ora, um incumprimento por parte das empresas ou de governos, mas apenas um efeito matemático da actualização de juros e de reembolsos futuros.
O ano de 2023 será marcado pela forte desaceleração da inflação e possível deflação nos últimos meses, o que se traduzirá em maior estabilidade e visibilidade para os investidores a partir do segundo semestre.
O ano também começou com o pé direito, com o preço da energia na Europa a baixar substancialmente. A título de exemplo, o preço do gás natural está ao nível mais baixo desde janeiro de 2022, a 65 euros MWh/hora, o que contrasta com o pico de 342 euros MWh/hora atingido há pouco mais de seis meses.
Estas são boas notícias para os consumidores e investidores, já que a perspectiva de redução da inflação traz consigo um alívio nos juros e nas carteiras dos consumidores, diminuindo a pressão sobre a economia. Tendo passado o pior ano desde os últimos 50, pode dizer-se que 2023 promete ser bastante melhor, principalmente para os portfolios diversificados.
Bons investimentos!
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.