O caso que foi noticiado esta semana sobre o processo movido por José Pacheco Pereira (JPP) contra João Lemos Esteves (JLM) por calúnia teria dado origem ao primeiro julgamento por “fake news” em Portugal.
Ambos acabaram por chegar a acordo e Lemos Esteves não só foi forçado a um pedido de desculpas e indemnização, como admitiu que tudo o que escrevera sobre JPP fora inventado.
O caso não deixa de ser fascinante. A própria figura de Lemos Esteves é um excelente caso de estudo: ex-professor de Direito (assistente convidado) da FDUL, que terá sido elogiado por Marcelo Rebelo de Sousa há mais de uma década como brilhante analista político, tornou-se, nos últimos anos, uma figura cada vez mais radicalizada na esfera política, que decidiu cair na toca do coelho dos sites de desinformação e conspiração alimentados por movimentos internacionais da extrema-direita.
Hoje em dia, já existe informação suficiente que nos permite saber como estas redes internacionais funcionam, financiadas de forma totalmente opaca. Mais. As falsidades que JLM admitiu inventar sobre Pacheco Pereira não foram apenas publicadas na forma de uma crónica de jornal. Foram, também, divulgadas em várias plataformas digitais, às quais o nome de JLM estava associado.
Trata-se de sites que partilham o mesmo intuito de disseminar informação falsa ou caluniosa. Mas, o que não tínhamos visto até agora era a admissão, pura e dura, de que tudo era uma invenção.
De certa forma, lamenta-se que o processo não tenha seguido para tribunal, pois teria permitido dissecar ainda mais a indústria de desinformação que tem proliferado em Portugal, estando Lemos Esteves longe de ser a única figura a recorrer a estes meios.
Sabemos da ameaça que representam este tipo de plataformas, mas o que está a ser feito para mitigar o seu impacto? São principalmente partidos e movimentos associados à extrema-direita que têm posto a circular narrativas anónimas nas redes sociais, que rapidamente ganham tração e são lidas por milhares de pessoas.
Muitas destas narrativas partem de factos reais, mas distorcidos de modo a provocar reações de medo, raiva e preconceito. A propaganda ainda é a arma principal dos nacionalistas populistas, mas um maior conhecimento da sua máquina de comunicação não trouxe necessariamente formas mais eficientes de lidar com ela.
Não podemos depender apenas de tribunais para que desinformadores sejam apanhados em falso, precisamos de mais soluções. As narrativas são muitas e o tempo é cada vez mais curto para as desconstruir, uma a uma.