Quando o leitor estiver a ler estas linhas, estarei provavelmente em representação da União dos Sindicatos Independentes (USI) em audiência com o senhor Presidente da República. Uma audiência que procura sensibilizar o máximo representante do Povo português para a indignidade e a imoralidade perpetradas por grandes e lucrativas empresas que estão a promover processos de despedimento colectivo. Empresas que, pela sua dimensão e história, deveriam perceber que têm especiais deveres de responsabilidade social. Empresas muito lucrativas que a pandemia não afectou e cujos trabalhadores foram incansáveis no serviço prestado aos seus clientes.

Como tive oportunidade de expressar recentemente na Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social, a propósito dos casos Banco Santander Totta e Millennium BCP, a sensibilização é útil, mas por vezes o autismo das elites obriga a que existam leis que não permitam imoralidades.

O que me leva a António Costa e Rui Rio. Um contente com o tipo e a (baixa) intensidade de oposição que lhe é feita. O outro aparentemente satisfeito porque achará que o tempo lhe corre de feição e o poder lhe cairá no colo de maduro.

Um e outro ao não quererem encarar o tema da revisão das leis laborais, para as tornar mais amigas dos trabalhadores e dos contribuintes portugueses, prestam um mau serviço a Portugal e aos portugueses. Se é certo que Pedro Passos Coelho teve que ceder aos credores internacionais, em todo o caso é tempo de António Costa e Rui Rio ouvirem as três Centrais Sindicais e reintroduzirem o princípio do tratamento mais favorável aos trabalhadores.

O recurso ao despedimento colectivo é um mau exemplo vindo das grandes empresas, num país em que as PME tiveram a fibra moral para aguentar o emprego dos seus trabalhadores, como se viu pelas recentes estatísticas publicadas pelo INE.

Uma empresa incumbente de telecomunicações que em quase 120 anos de história, nunca tal desiderato tinha sido tentado. Ou um banco que beneficiou de tempo e dinheiros dos contribuintes, quando os accionistas privados se evaporaram numa recapitalização que tinha que ser feita, mas que agora não quer conceder aos seus trabalhadores o tempo e a dignidade que os contribuintes lhe deram.

A terminar, algumas sugestões de leitura. Porque as elites são cínicas e tendem a considerar os outros à sua imagem e valores, recomendo a leitura do notável “Humanidade” (Rutger Bregman, Bertrand) que nos mostra que a grande maioria dos seres humanos, ao longo da história, são bons e cooperantes.

Recomendo também a leitura de “Vera Lagoa – um diabo de saias” (Maria João da Câmara, Oficina do Livro), sobre uma mulher de coragem na denúncia dos totalitarismos, homens providenciais, ou das vanguardas revolucionárias pretensamente iluminadas. Fê-lo, importa frisar, numa altura em que não era seguro fazê-lo.

E porque o Verão é calor e água, recomendo igualmente “Afastar-se” (Luísa Costa Gomes, D. Quixote), treze contos em torno da água, naquilo que será, talvez, a primeira colecção temática da autora.

Finalmente, a terminar, um caloroso abraço para os trabalhadores bancários da CGD que no passado dia 9 de Agosto dignificaram a profissão repudiando a injustiça.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.