“A democracia ameaçada”, é o Editorial de Diogo Queiroz de Andrade (DQA) no “Público” de 31JUL18. DQA agarra em recentes investigações do Parlamento Britânico, num relatório da Universidade de Oxford e (adivinha) os resultados das investigações de Robert Mueller nos EUA, para denunciar a “manipulação democrática” dos eleitores pelo Facebook e provar o papel central da Rússia nessa manipulação. Com o quadro “completo”, DQA, conclui: “O Facebook é a máquina perfeita para a manipulação em larga escala”. E é mais perigosa, porque é uma “dócil manipulação”.

Não se tratará agora de questionar as certezas certas do editorialista sobre a influência determinante do Facebook nos resultados de referendos e eleições, e o papel relevante nesta nova guerra fria, via redes sociais, da Rússia. Mas apenas pretexto para levantar interrogações.

DQA e outros jornalistas e comentadores e articulistas dos media portugueses (imprensa escrita, rádio, televisão) há décadas que determinam, conformam o pensamento dominante (e único), económico, político, ideológico e partidário (alguns diriam pensamento mainstream) tendo como referentes os quadros ideológicos neoliberais, a “ideologia comunitária”, isto é, a que tem suportado a integração capitalista europeia, ou a simples replicação de correntes mediáticas do imperialismo. O “Público” onde DQA escreve é um caso de estudo!

Quando será que DQA e os seus pares levantarão o problema da “manipulação democrática” dos eleitores portugueses pelos seus órgãos de comunicação social, no decurso da intensa vida democrática do país após o 25 de Abril, em sucessivas eleições e referendos? Quando baterão contritos no peito, face aos riscos que percepcionam no Facebook, da tentativa de configuração do poder político a um “arco de governação” PS, PSD, CDS, excluindo todos os outros partidos? Quando mostrarão verdadeiro e sentido arrependimento, pedindo desculpa aos portugueses, pela mentirola eleitoral, repetida vezes sem conta, da pretensa “eleição do primeiro-ministro”? Quando farão alguma investigação, análise e reflexão, a que, corresponderão editoriais, sobre o comportamento de uma comunicação social, que em geral, claramente marginaliza e discrimina pelo silêncio, ocultação e tantas vezes pela deturpação a intervenção e posicionamento de um partido como o PCP?

Quando deixarão de achar estranho que um partido, analisando os resultados eleitorais, se refira criticamente à influência negativa da comunicação social? Quando deixarão de cobrir com o manto diáfano da “independência” os agentes e actores mediáticos e políticos, de opções políticas, ideológicas e até partidárias bem assumidas (basta não estar no “activo”, isto é não desempenhar funções institucionais, para ganhar o adjectivo), para falsificarem e manipularem o debate democrático, por ausência de efectivo contraditório, ou mesmo só da possibilidade de contraposição e defesa de quem nunca está presente, por exclusão? Quando?

E esta não é a manipulação doce do Facebook, a que se refere DQA. É uma manipulação com artilharia pesada, por terra, ar e mar. E, ao mesmo tempo, suprema contradição, não se vê nem se sente, e entra-nos todos os dias em casa, sem nos pedir licença. Com a agravante de que a pagamos.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.