A proposta em causa, independentemente de poder e dever ser melhorada, sugere um conjunto importante de medidas susceptíveis de contribuírem para potenciar a competitividade das empresas portuguesas.

A este propósito importa sublinhar que os interesses das empresas portuguesas não correspondem necessariamente aos dos empregadores.
Quando sublinho que é importante que a legislação laboral portuguesa vá ao encontro das necessidades das empresas, estou a pensar simultaneamente em todos os actores que compõem o universo de cada empresa: accionistas, gestores e trabalhadores.

Aliás, deve precisar-se que, em rigor, considerando a mundividência das novas gerações, é cada vez mais certo que a legislação laboral apenas poderá ser verdadeiramente positiva para as empresas se for estimulante para os trabalhadores.

Em minha opinião, este processo de alteração ao Código do Trabalho e legislação complementar poderia ser uma excelente oportunidade para se ajudar a modernizar a economia portuguesa.

Infelizmente, a discussão mediática da proposta foi logo desde o início totalmente contaminada por questões laterais ou secundárias, o que está a impedir uma análise serena e ponderada do seu conteúdo por parte dos parceiros sociais presentes na concertação social e das forças políticas que se encontram representadas na Assembleia da República.

A perturbação do ambiente neste âmbito deve-se simultaneamente a dois factores. Por um lado, alguma inabilidade por parte do governo em termos de comunicação, o que permitiu que a discussão do assunto fosse pervertida desde o começo. Por outro lado, o aproveitamento oportunista de alguma comunicação social, que incendiou completamente a discussão, desprezando a reflexão sobre a substância e privilegiando a desinformação bombástica e a busca do click-bait.

Em termos conceptuais, a legislação laboral de qualquer país corre cada vez mais o risco de se tornar desenquadrada da realidade e até obsoleta se não for feito um esforço permanente no sentido de a adaptar.

Para esse efeito, é fundamental que haja a preocupação de ajustar os quadros normativos à necessidades das empresas em cada momento e à cultura de cada geração.

As empresas actuais precisam essencialmente de facilidade de contratação, flexibilidade do tempo de trabalho e mobilidade funcional.
As novas gerações de trabalhadores desejam igualmente flexibilidade do tempo de trabalho, possibilidade de trabalhar à distância, novos desafios, melhores salários e crescente autonomia.

Seria suposto que, com base em tais pressupostos, a discussão incidisse agora de forma predominante em temas como o banco de horas individual, a compra de férias por parte dos trabalhadores ou a criação de retribuições variáveis com menor carga fiscal.

De igual modo, faria sentido que se procurasse criar formas de dinamização da contratação colectiva, para que em cada sector, empresa ou grupo de empresas, as partes pudessem mais facilmente encontrar pontos de convergência entre os interesses recíprocos.

No interesse do país seriam estes os assuntos que deveriam merecer a atenção por parte do governo, dos grupos parlamentares e dos parceiros sociais.

Na verdade, o Código do Trabalho não pode ser encarado como uma moeda de troca política, uma arma de arremesso mediática, um mote para chicana sindicalista ou um pretexto para discussões teóricas e académicas. Pelo contrário, deverá valer por si só e pelo papel que desempenha na economia e na sociedade.

Temo que não seja agora fácil corrigir os erros iniciais e que uma discussão séria e construtiva esteja neste momento fortemente comprometida. Não obstante, seria absurdo que se perdesse esta oportunidade e que não se fizesse tudo no sentido de transformar o novo Código do Trabalho num instrumento útil para a economia e para o país. Pelo que, mesmo que seja difícil, ainda estamos a tempo de nos deixarmos de vacuidades e nos empenharmos em servir realmente o país.