Entrámos finalmente na nova legislatura. Será com certeza um período apaixonante para quem, em Portugal, gosta de política.

Porque vamos viver num clima de grande instabilidade, com o Governo (que com o apoio de 80 deputados (não contando a IL) é o mais minoritário desde 1985, quando o Grupo Parlamentar do PSD, que apoiava o 1.º Governo de Cavaco Silva, tinha 88 deputados em 250) a ter constantemente de encontrar apoios (ou pelo menos abstenções) para garantir a aprovação de medidas legislativas de alcance fundamental.

Porque vamos estar permanentemente a especular sobre o que o Presidente fará em qualquer cenário – mas nisto de cenários o Presidente é o melhor especulador, e terá sempre a possibilidade de fazer mais um passeio a uma das pastelarias nas imediações do Palácio de Belém para dar assunto aos especialistas.

Porque vamos estar atentos aos resultados das eleições regionais da Madeira e às eleições europeias, que alimentarão especulações intermináveis sobre o possível impacto em futuras (e talvez não muito distantes…) novas eleições legislativas nacionais, para as quais todos os partidos se estão a preparar – não vá de repente o Presidente agir conforme algum cenário já antecipado.

Porque vamos estar à espera do resultado das eleições de Novembro nos EUA, para vermos se a Europa irá enfrentar mais um período de isolacionismo americano, ou se poderemos continuar a contar com a NATO como um pilar de defesa do Ocidente.

Porque vamos continuar a sofrer as consequências da guerra na Ucrânia, em que ninguém quer tomar parte activa para não dar à Rússia um pretexto para se lançar em sonhos antigos – que não cessaram, apenas ficaram um pouco mais desfocados desde o fim da Guerra Fria.

Porque vamos continuar a ser testemunhas distantes, mas interessadas e receosas, do que se passar na guerra de Israel contra o Hamas, que nos repugna a todos por todas as razões, e em que todos temos um interesse afectivo ou intelectual, num e noutro caso assentes em considerações sobre injustiças históricas de sinal contrário.

Porque vamos continuar a assistir ao deslocamento dos centros de gravidade económicos e geopolíticos do Atlântico para o Pacífico (e em menor escala para o Índico), com a China e a Índia a afirmarem-se como potências emergentes do século XXI, demonstrando dinamismo e capacidade económica e tecnológica que podem vir a subalternizar a Rússia e até a Europa, e que até podem fazer com que os Estados Unidos, se insistirem no isolacionismo, percam relevância e influência (que mantêm por ainda serem a maior potência militar do planeta em termos de potencial nuclear e tecnológico).

Porque vamos continuar a discutir a crescente contradição que grassa na Europa entre nacionalismo e reforço da integração económica, política e social, ignorando que as pressões nacionalistas que dominaram desde os tempos de Napoleão até ao final da Segunda Guerra Mundial nos deram os períodos mais violentos que a Europa e o Mundo viveram, e que só foi possível quebrar com a criação do Mercado Comum e da União Europeia.

Repito, será com certeza apaixonante para quem em Portugal gosta de política. Mesmo quando a linguagem e a estratégia usadas por alguns sectores estejam nos limites (e demasiadas vezes os ultrapassem) do aceitável em termos de cordialidade e urbanidade, e baixe ao nível da conversa de tasca, da agressão, do insulto e da mentira. Mas esse é outro assunto. E até acaba por ser muito português.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.