Quando se questiona qual a tendência do sector imobiliário depois deste estado de emergência, os três cenários possíveis para a evolução do mercado são consensuais: uma recuperação rápida em V, uma evolução moderada em U, ou uma recessão em L, com um efeito negativo persistente sobre o mercado. Destas três letras, qual será a que define o cenário mais plausível em Portugal?

Distanciamento social e quarentena, embora imprescindíveis, serão muito difíceis para milhares de pequenas empresas e trabalhadores independentes, que formam a coluna dorsal da economia portuguesa.

A intensidade do choque será determinada pela duração do estado de emergência, pelas respostas das políticas económicas e fiscais, bem como pelo comportamento do consumidor frente às adversidades que irão surgir na pós-crise sanitária. É também necessária uma monitorização contínua da evolução da pandemia nos outros países europeus e, claro, nos EUA, que certamente irão influenciar a economia nacional.

Muitos modelos de previsões são baseados no comportamento padrão e racional do consumidor. Mas esta situação irá obrigar-nos a mudar paradigmas e perspetivas de vida, o que certamente dará origem a novos comportamentos. A situação extrema que vivemos irá, também, potenciar comportamentos antirracionais no consumidor.

Porém, o maior desafio é evitar uma trajetória em “L”. Embora ainda seja cedo para determinar quais as consequências reais na economia, espera-se uma recessão geral no curto prazo, que causará uma queda abrupta das atividades económicas.

É expectável que Portugal possa deparar-se com dois tipos prováveis de recuperação, em “V” ou em “U”, ou seja, no cenário V a retoma surge de forma muito rápida, o que geralmente ocorre após superar crises muito limitadas no tempo, como a que estamos a atravessar. Ou, inversamente, uma recuperação em “U”, mais lenta e progressiva, ao longo do tempo.

Qual a evolução que se perspetiva para Portugal?

Seria imprudente antecipar até que ponto esta crise sanitária terá um impacto específico no setor imobiliário, uma vez que o cenário muda quase a cada hora. Sabe-se, contudo, que será algo temporário. É uma situação controlada ao longo do tempo mas que implicará, a médio prazo, uma ligeira queda nos preços, em geral e em todo o território nacional, com exceção da construção nova, para a qual se antecipa a manutenção dos actuais valores de comercialização.

Antecipa-se, também, uma regularização de preços no mercado. Os proprietários passarão a ter uma relação mais equilibrada com os compradores, algo que não é apenas positivo, mas também necessário. É igualmente provável que, nesta situação económica, alguns proprietários tenham necessidade urgente de vender para enfrentar eventuais faltas de liquidez, aplicando descontos mais agressivos no preço, para conseguir uma venda rápida dos seus imóveis, no curto prazo.

O efeito negativo da economia impactará, certamente, o mercado imobiliário – sobretudo com o não pagamento de rendas, a venda de ativos imobiliários para recuperar a liquidez das empresas e de alguns investidores, a venda de segundas residências – um contexto que atrairá investidores com liquidez para comprar com desconto, no curto prazo.

A promoção imobiliária, por natureza, é um negócio de ciclo longo. É normal funcionar com horizontes de médio prazo e está preparado para ciclos de alguns meses sem vendas, como será o caso de alguns projetos. Acredito que o segmento mais afetado no mercado imobiliário será, claramente, a procura internacional, pelas restrições nas viagens entre países que seguramente irão prolongar-se por alguns meses.

Com a crescente profissionalização do setor, muitas empresas estão hoje melhor preparadas para enfrentar esta crise, mas há um desafio óbvio a enfrentar, como em todos os setores de atividade: a gestão de tesouraria. A duração do estado de alarme, e o tempo necessário para que a situação comece a normalizar, implica que muitas empresas imobiliárias terão dificuldades na continuação da sua atividade.

Porém, há algo positivo a retirar desta pandemia. É o impulso importante que as ferramentas digitais deram, não apenas para o teletrabalho, mas para continuar a estabelecer contato permanente entre consultores imobiliários e clientes, através da digitalização dos processos que têm sido implementados, ao longo dos últimos meses.

Depois de termos sido forçados a implementar o teletrabalho, como fórmula para continuar a nossa vida profissional, muitas empresas provavelmente passarão a implementar mais esta solução que, da mesma forma, será também uma opção ideal para muitos trabalhadores, o que afetará diretamente o mercado de trabalho, o mercado imobiliário de escritórios e, também, o mercado residencial, trazendo alterações nas preferências de tipo de imóvel e zonas para adquirir ou arrendar casa e, provavelmente, uma diminuição na procura de casa no centro das principais cidades.

Ainda é cedo para termos certezas nestes tempos incertos. Contudo, certo é que este é o momento de mostrar um inequívoco sentido de compromisso nacional, responsabilidade social e assumir um esforço comum para enfrentar uma situação sem precedentes, da qual emergiremos, sem dúvida, reforçados e com uma nova perspetiva da sociedade, porque esta pandemia vai obrigar-nos a repensar e mudar muitos paradigmas.