O momento trágico que a Europa atravessa, com milhares de mortos provocados pela pandemia da Covid-19, leva a uma reflexão profunda sobre o modo e o tempo como a União Europeia (UE) e o Banco Central Europeu (BCE) vão intervir nas crises.

Infelizmente, há que usar o plural. Porque a crise epidemiológica está muito longe de estar ultrapassada e a crise económica já se sente e ainda mal começou. Em ambos os casos, num momento inédito de desespero e gravidade absoluta, a resposta não pode ser dada somente por cada país afectado.

Nenhum dos países mais atingidos, em número de mortos (Itália, Espanha e França) tem capacidade per si para absorver o impacto das referidas crises na economia. Nenhum país está preparado para tal. Nenhum país tem capacidade para sobreviver a um lockdown brutal, paragem forçada das empresas e a milhões de postos de trabalho em risco.

A resposta a uma catástrofe desta dimensão tem que ser necessariamente europeia. Aliás, noutra escala, muito inferior, em termos de número de vítimas, a UE, no caso do terrorismo, teve resposta a nível orçamental. Não se espera, agora, outra forma de mitigar os problemas que não seja global.

O momento tem que ser de conjugação de esforços e não de julgamentos com a ligeireza com que o ministro das Finanças holandês se pronunciou sobre a hipotética incapacidade orçamental de Espanha para lidar com a actual crise. Poderá ainda ser cedo para avaliar o impacto económico provocado pela pandemia, mas já é tarde para encontrar soluções de apoio aos países mais afectados.

O facto do Conselho Europeu ter reunido e, no final, não terem sido anunciadas medidas adequadas à emergência do momento, acrescido ao facto de a reunião seguinte ter lugar duas semanas depois, faz antever o pior. Haverá alguma razão para não ter sido criado um comité de emergência face aos desafios do presente, que em estreita ligação aos governos nacionais anunciasse a progressiva criação de programas financeiros para mitigar já a crise económica?

Do ponto de vista político e diplomático, caso a UE e o BCE não consigam encontrar soluções para ajudar, é a sua própria existência que fica em causa.  Porque, desde 1951, existe um caminho que foi traçado, que nos levou a uma convergência económica e financeira. É certo que o percurso teve avanços (moeda única, Schengen) e recuos (Brexit).

É certo que nunca houve, em simultâneo, em tantos países, uma crise destas dimensões. Mas a UE tem a obrigação, no cenário que já provocou o maior número de mortos, desde a Segunda Guerra Mundial, de não repetir os erros do passado, ou seja uma reacção tardia, burocrática e lenta. Desta vez não poderá haver desculpa com relatórios, visitas técnicas, erros nos multiplicadores, nem falhas na calibração dos modelos matemáticos. Porque não há tempo para tal.

O principal problema é, pois, tempo. O tempo que levará a sarar as feridas dos que perderam os seus familiares. O tempo que levará a voltar ao momento económico antes da crise. O tempo que levará às taxas de desemprego do último trimestre de 2019. E este tempo só pode ser encurtado com estímulos económicos e verdadeiros programas-quadro europeus.

Poderemos não ter brevemente uma vacina para a Covid-19, mas há que criar já uma “vacina” financeira para reduzir o tempo de recuperação económica. Onde antes havia programas para inovação e investimento, nas empresas, deve haver agora programas para a salvação das mesmas, seja por reafectação orçamental dos programas europeus, seja pela criação de novos programas.

Neste momento, é prioritário proteger as empresas e salvaguardar os postos de trabalho, para que haja consumo após a maior crise que atingiu a Europa nas últimas décadas.

Se nada for feito e se o imobilismo ou a indecisão politica tomar conta dos acontecimentos, ou a linha narrativa for ambígua, a demora na solução à escala europeia pode provocar que Espanha ou Itália, na impossibilidade de desvalorização da sua moeda, tenham a tentação de sobreviver, fora do contexto europeu, aliás compreensível, e de emitir dívida cujos juros vão necessariamente ser mais altos do que uma emissão europeia, ou pior, sair do Euro, para a devida recuperação económica, que poderá levar anos.

A UE como a conhecemos, tem aqui uma oportunidade única de demonstrar a sua verdadeira importância, no momento em que os países passam a mais dramática fase da sua história recente.

A questão mais delicada é todos sabermos que é possível. Sim, é possível uma resposta financeira adequada à escala europeia. Relativamente à vontade política, brevemente saberemos. Só uma intervenção europeia, forte e assertiva, poderá evitar que à crise epidemiológica se some uma devastadora crise económica. O tempo da UE é, pois, de uma verdadeira prova dos nove. Neste caso, a prova dos 27.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.