Sou Católico. Fui, desde cedo, educado a respeitar a vida, quer fosse a minha, quer a do próximo. Sou, no entanto, favorável à descriminalização da eutanásia em Portugal, permitindo a todos aqueles que sofrem optar por um fim digno.

Defendo que, pela sensibilidade do tema, pelos valores em presença, pelas consequências irreversíveis que a decisão da despenalização da morte assistida pode vir a ter, deveríamos realizar um amplo debate nacional e dar a palavra ao povo, através da realização de um referendo, antes de proceder a uma alteração legislativa desta natureza.

Defendo a legalização da eutanásia não porque quero que Portugal assuma uma posição vanguardista em temáticas tradicionalmente fraturantes das sociedades, mas por entender que a liberdade é o valor mais importante no mundo dos nossos dias e que devemos dar às pessoas a possibilidade de fazer as suas escolhas, desde que as mesmas sejam devidamente informadas.

Em Portugal, ao contrário do que sucede noutros países, a eutanásia é uma prática que pode ser punida como homicídio privilegiado, como homicídio a pedido da vítima e como crime de incitamento ou auxílio ao suicídio, com penas que poderão ir até aos oito anos de prisão.

Na União Europeia, três países admitem legalmente a morte assistida (Holanda, Bélgica e Luxemburgo), juntando-se-lhes, no espaço europeu, a Suíça. Assim, todos aqueles que nos outros países europeus são portadores de doenças incuráveis e desejam pôr fim à vida, acabando com o sofrimento intolerável, são forçados a fazer uma espécie de turismo terminal, recorrendo a um dos países que legalizaram a prática da eutanásia.

Se diariamente inúmeras pessoas, por motivos muito variáveis, alguns mais aceitáveis do que outros, põem termo à vida, a questão coloca-se, simplesmente, no papel que outras pessoas, nomeadamente profissionais de saúde, podem ou devem assumir neste domínio, acatando ou questionando o desejo daqueles que conscientemente pretendem partir deste mundo.

Na prática, a eutanásia é uma questão de liberdade. Liberdade do paciente que decide pôr termo à vida e liberdade do profissional de saúde que decide auxiliá-lo nessa sua opção ou que recusa tomar parte nesse ato.

E se parece importante não limitar a possibilidade de um paciente decidir sobre o seu destino, igualmente importante será não impor a outrem a obrigação de pactuar com essa decisão, assegurando-lhe a liberdade de se recusar a tomar parte num ato que contrarie as suas convicções.

O que me parece no mínimo questionável é que se pretenda, a todo o transe, adiar a morte de um doente que se encontra em fase terminal, procurando, por vezes obstinadamente, mantê-lo ligado à vida e perpetuando um sofrimento insuportável.

Julgo, pois, que é importante que se debata um tema tão sensível como este, em que se confrontam visões que tradicionalmente são extremadas, que se analisem os prós e os contras e que se dê a palavra à população, para que possa manifestar-se sobre a eventual despenalização da morte assistida, evitando-se, desta forma, que se obriguem aqueles que querem deixar o mundo dos vivos a ir morrer longe dos seus.

Uma decisão conscienciosa, em situações de sofrimento extremo, mediante parecer médico, com possibilidade permanente de revogação da decisão por parte do paciente, parece-nos a melhor solução para todos os que defendem um direito inalienável das pessoas ao seu destino.